A SAUDADE
«Ó Saudade! Ó Saudade! Ó Virgem Mãe Que sobre a terra santa portuguesa, Conceberás isenta de pecado, O Cristo da Esperança e da beleza!»
Teixeira de Pascoaes
A Identificação de um País
Pascoaes vai levar às últimas consequências a sua teoria poética imiscuindo-se napràxzs política. Será nesse complexo ideal que aparecerá o movimento da Renascença Portuguesa, movimento regenerador e reformador que contará com inúmeras figuras, como Jaime Cortesão, Afonso Duarte, Mário Beirão e Leonardo Coimbra. O movimento terá ao seu serviço a revista A Águia, que no texto manifesto concluirá:
«Sim, a alma portuguesa existe, e o seu perfil é eterno e original.
Revele-mo-la agora a todos os portugueses, para que todos possam cumprir o destino que por natureza, nascimento e sangue lhe pertence. É, então, um novo Portugal, mas português, que surgirá à luz do dia e a civilização do mundo sen-tir-se-á mais dilatada» (A Águia, n°l, 2 série, 1912).
O que queria afinal o grupo de Pascoaes?
~Renascer é regresssar às fontes originárias da vida, mas para criar uma nova vida» (...) «Renascer é dar a um antigo corpo uma alma fraterna, em harmonia com ele.» E mais além: «Se não existe uma alma portuguesa, teríamos de evolucionar conforme as almas estranhas, teríamos de nos fundir nessa massa amorfa da Europa; mas a alma portuguesa existe, bem desde a origem da Nacionalidade...» (A Águia. n°l, 2a série, 1912).
O Poeta tinha já, por essa altura, escrito alguns dos seus melhores livros - Terra Proibida; Vida Etérea, As Sombras, Senhora da Noite, Maranus e Regresso ao Paraíso.
O Dom Quixote português iniciava a pregação em defesa da sua virgem, a Saudade.
A Saudade vai ser o testemunho que se transmitirá de geração em geração, a voz da Pátria.
A inquietação religiosa do poeta e a sua ambição filosófica levaram-no por esse Portugal fora a pregar a Boa Nova: «...Eis-me a pregar a Saudade por várias terras do País! E isto também é interessante porque quixotesco. Há três dias preguei na Póvoa de Varzim (...). O certo é que o povo, pondo de parte os bacharéis (esta palavra tem um sentido especial entre nós) empedernidos, fixados em imutáveis formas de banalidade e tédio, se vai entusiasmando, pressentindo qualquer coisa que lhe fala, embora vagamente, à alma.» (Epistolaria Ibérico - Carta a Migue/ de Unamuno).
Esta íntima relação com o Povo, esta quase cumplicidade, vai Pascoaes gravá-la numa frase demonstrativa do seu sentimento:
«Em Portugal o que existe é o Povo e os seus Poetas: o resto é carne morta» (in Seara Nova, 1966).
O Projecto Po(ético)lítico sem Rosto (O Rosto da Saudade)
Ao colocar a Saudade (a mãe perdida, a da infância) no centro da sua «filosofia» Pascoaes propõe-se revelar o alcance universal duma concepção do mundo genuinamente lusíada.
No fim da sua existência física, em 1952, Pascoaes escreve (A Minha Cartilha):
«Uma teoria religiosa ou filosófica necessita duma base que seja incerta ou oscilante, entre um sim e um não.» - esta expressão demonstra a ambivalência, face à Mãe, de quem a teve demasiado próximo - «É nesta oscilação que se afirmam as verdades alcançadas pela nossa inteligência. Mas a base oscilante tem de ser de pedra... filosofal; filosofal para os filósofos, e de pedra ou Pedro para os místicos.
Necessito da pedra filosofal que eu, não sendo filósofo, filosofo; e, não sendo padre, digo missa, no altar mor da minha freguesia - vulgo, Ladário» (A Minha Cartilha).
Ao confessar que «não sendo filósofo, filosofo e não sendo padre, digo missa», dá-nos, por certo, o que há de sentimento relativo, brumoso, na ideologia da Saudade, que se tornaria, pela acção do Poeta, mística nacional. Esta expressão revela-nos, também, o que há de recusa da mulher (o celibato vem com o Padre, em Portugal, ou devia vir...).
Surge o movimento da Renascença, movimento político-cultural que congregou à sua volta, como já foi referido, um invejável grupo de intelectuais apóstolos da Saudade e que, no âmbito desse movimento criou bibliotecas, universidades populares, onde eram dadas lições; proferidas conferências; onde a Palavra era revelada.
António Sérgio lançará a crítica racionalista, nas folhas de A Águia contra a filosofia que havia erigido a Poesia como conteúdo etnoreligioso, guia dos destinos da Nação.
Mas, Pascoaes, partindo de outra lógia, dirá: «Os portugueses são seres animais e humanos; a Pátria portuguesa é um ser espiritual», como o imago da mãe, acrescentamos nós. E referindo-se ao cristianismo: «O nosso cristianismo tradicional adapta-se espontaneamente a esta concepção religiosa da Família, que ele diviniza pelo culto de Maria (avatar da Mãe, dizemos nós), o tipo supremo da Mãe. E diviniza a nossa Pátria, pela intervenção de Jesus na fundação de Portugal, como divinizou a humanidade pelo sacrifício do calvário» (A Arte de ser Português).
In: O Fantasma de Pascoaes
«Ó Saudade! Ó Saudade! Ó Virgem Mãe Que sobre a terra santa portuguesa, Conceberás isenta de pecado, O Cristo da Esperança e da beleza!»
Teixeira de Pascoaes
A Identificação de um País
Pascoaes vai levar às últimas consequências a sua teoria poética imiscuindo-se napràxzs política. Será nesse complexo ideal que aparecerá o movimento da Renascença Portuguesa, movimento regenerador e reformador que contará com inúmeras figuras, como Jaime Cortesão, Afonso Duarte, Mário Beirão e Leonardo Coimbra. O movimento terá ao seu serviço a revista A Águia, que no texto manifesto concluirá:
«Sim, a alma portuguesa existe, e o seu perfil é eterno e original.
Revele-mo-la agora a todos os portugueses, para que todos possam cumprir o destino que por natureza, nascimento e sangue lhe pertence. É, então, um novo Portugal, mas português, que surgirá à luz do dia e a civilização do mundo sen-tir-se-á mais dilatada» (A Águia, n°l, 2 série, 1912).
O que queria afinal o grupo de Pascoaes?
~Renascer é regresssar às fontes originárias da vida, mas para criar uma nova vida» (...) «Renascer é dar a um antigo corpo uma alma fraterna, em harmonia com ele.» E mais além: «Se não existe uma alma portuguesa, teríamos de evolucionar conforme as almas estranhas, teríamos de nos fundir nessa massa amorfa da Europa; mas a alma portuguesa existe, bem desde a origem da Nacionalidade...» (A Águia. n°l, 2a série, 1912).
O Poeta tinha já, por essa altura, escrito alguns dos seus melhores livros - Terra Proibida; Vida Etérea, As Sombras, Senhora da Noite, Maranus e Regresso ao Paraíso.
O Dom Quixote português iniciava a pregação em defesa da sua virgem, a Saudade.
A Saudade vai ser o testemunho que se transmitirá de geração em geração, a voz da Pátria.
A inquietação religiosa do poeta e a sua ambição filosófica levaram-no por esse Portugal fora a pregar a Boa Nova: «...Eis-me a pregar a Saudade por várias terras do País! E isto também é interessante porque quixotesco. Há três dias preguei na Póvoa de Varzim (...). O certo é que o povo, pondo de parte os bacharéis (esta palavra tem um sentido especial entre nós) empedernidos, fixados em imutáveis formas de banalidade e tédio, se vai entusiasmando, pressentindo qualquer coisa que lhe fala, embora vagamente, à alma.» (Epistolaria Ibérico - Carta a Migue/ de Unamuno).
Esta íntima relação com o Povo, esta quase cumplicidade, vai Pascoaes gravá-la numa frase demonstrativa do seu sentimento:
«Em Portugal o que existe é o Povo e os seus Poetas: o resto é carne morta» (in Seara Nova, 1966).
O Projecto Po(ético)lítico sem Rosto (O Rosto da Saudade)
Ao colocar a Saudade (a mãe perdida, a da infância) no centro da sua «filosofia» Pascoaes propõe-se revelar o alcance universal duma concepção do mundo genuinamente lusíada.
No fim da sua existência física, em 1952, Pascoaes escreve (A Minha Cartilha):
«Uma teoria religiosa ou filosófica necessita duma base que seja incerta ou oscilante, entre um sim e um não.» - esta expressão demonstra a ambivalência, face à Mãe, de quem a teve demasiado próximo - «É nesta oscilação que se afirmam as verdades alcançadas pela nossa inteligência. Mas a base oscilante tem de ser de pedra... filosofal; filosofal para os filósofos, e de pedra ou Pedro para os místicos.
Necessito da pedra filosofal que eu, não sendo filósofo, filosofo; e, não sendo padre, digo missa, no altar mor da minha freguesia - vulgo, Ladário» (A Minha Cartilha).
Ao confessar que «não sendo filósofo, filosofo e não sendo padre, digo missa», dá-nos, por certo, o que há de sentimento relativo, brumoso, na ideologia da Saudade, que se tornaria, pela acção do Poeta, mística nacional. Esta expressão revela-nos, também, o que há de recusa da mulher (o celibato vem com o Padre, em Portugal, ou devia vir...).
Surge o movimento da Renascença, movimento político-cultural que congregou à sua volta, como já foi referido, um invejável grupo de intelectuais apóstolos da Saudade e que, no âmbito desse movimento criou bibliotecas, universidades populares, onde eram dadas lições; proferidas conferências; onde a Palavra era revelada.
António Sérgio lançará a crítica racionalista, nas folhas de A Águia contra a filosofia que havia erigido a Poesia como conteúdo etnoreligioso, guia dos destinos da Nação.
Mas, Pascoaes, partindo de outra lógia, dirá: «Os portugueses são seres animais e humanos; a Pátria portuguesa é um ser espiritual», como o imago da mãe, acrescentamos nós. E referindo-se ao cristianismo: «O nosso cristianismo tradicional adapta-se espontaneamente a esta concepção religiosa da Família, que ele diviniza pelo culto de Maria (avatar da Mãe, dizemos nós), o tipo supremo da Mãe. E diviniza a nossa Pátria, pela intervenção de Jesus na fundação de Portugal, como divinizou a humanidade pelo sacrifício do calvário» (A Arte de ser Português).
In: O Fantasma de Pascoaes
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