Carlos Carranca - neste lugar sem portas

terça-feira, março 31, 2009

Praça da República (28 de Março)

Com moderação de Luís Santos, Mário Martins e Mário Campos são os convidados de mais um “Praça da República”, programa gravado no Hotel D. Luís (Coimbra) e emitido pela Rádio Regional do Centro (96.2 fm) a 28/03/2009.
Imagem e edição: Geraldo Barros.

domingo, março 29, 2009

ÂNGELO

A Morte não estava anunciada – ele não a esperava, nem tão pouco os seus familiares e amigos. Veio inesperadamente, sem avisar ninguém, silenciosa e traiçoeira, com tanta violência,porém, que fez disparar o coração – e te fulminou!

O ataque chegou disfarçadamente, inesperado e rápido: será que ele se emocionou com o jogo do seu Benfica? Teve aviso ou ameaça? O Ângelo não se precipitava com possíveis acidentes, sempre atento na estrada, pressentindo o que os outros, distraídos, não tinham observado - e agia a tempo, como daquela vez em que, já de noite, nos aproximávamos de Lisboa. Ele desviou-se de um carro que o ultrapassou, perigosa e ilegalmente - e só depois tivemos a sensação de que escapámos do choque por obra e graça da manobra oportuna e eficiente do Ângelo.

Foi nosso companheiro de muitas horas, durante as férias dos últimos anos, em Portugal. Conversávamos até de madrugada. Íamos e vínhamos por Cascais e arredores com a Idalina e o Carlos Carranca, que frequentemente nos convocava para espectáculos teatrais - ou para um recital de poesia ou para o lançamento de livros ou para um concerto de fados de Coimbra ou para um almoço ou jantar... E, se não havia canções, escutávamos o Carranca, o Luís Góes e outros companheiros.

Nas tardes de calor, o “museu” familiar, onde havia de tudo um pouco – desde os poemas e retratos de Miguel Torga às ferraduras e outros acessórios de bois, cavalos e mulas. E nada era melhor que o fresquinho do salão – e o refrigerante ou o uisquinho. Contudo, o mais agradável era o diálogo fácil e fraterno, comentando mil e uma coisas - sem falar (mal) dos outros!

E agora, Ângelo? A notícia da viagem sem retorno chegou-nos por telefone. Ligamos e atendeu-nos o Victor , mas só conseguimos dizer: “Pêsames”. O silêncio é de ouro... Ficaste perto do Zé e do Antonino, que foram antes fazer companhia aos primos José Ventura (que contava histórias à minha avó Conceição de Folques) e Matilde. Definitivamente, estás em Arganil, que tanto amavas e defendeste até no futebol, partilhando essa devoção por Cascais. Ao longe, a Beira moçambicana... Perto, a família e os amigos, mais o Benfica do coração que te atraiçoou.

Lamento que não tenhas vindo ao Brasil para conhecer esta cidade grande demais, que nos assusta e enternece, porém de braços abertos para os amigos. Que pena! E o pior é que não voltarás a Cascais e só poderei revisitar-te, mudo e triste, em Arganil.
João Alves das Neves

A condenação da utilização de computadores na educação infantil

Pedagogos internacionais condenam computadores na educação infantil


O mundo da pedagogia continua em busca ávida de soluções remediativas adaptadas aos tempos.
Por último tivemos uma educação dedicada ao hediondo culto da raça, que em Portugal encontrou expressão, durante o período totalitário fascista, na famigerada “Mocidade Portuguesa” decalcada da Juventude Hitleriana da Alemanha nazi. Agora, apesar dos vastos conflitos puramente humanos que afligem a classe docente, tenta-se uma solução electrónica-totalitária para o ensino: a distribuição em massa de 500.000 minicomputadores “Magalhães” (na realidade, um plagiato do projecto visionário da OLPC Foundation, usando uma versão modificada dos minicomputadores “Classmate” americanos da Intel) por todo o ensino básico.
O empreendimento foi anunciado como uma “revolução para a educação em Portugal” e um projecto “sem igual no mundo”, sendo que a máquina é apresentada como autêntica janela para o futuro e para a vida das novas gerações. Esta experiência não possui entretanto qualquer qualificação pedagógica prévia, e numerosas realidades acerca dos seus efeitos catastróficos para um saudável desenvolvimento das crianças nos primeiros anos escolares permanecem desconhecidas para pais, professores e o grande público. O tema já foi estudado em profundidade em inúmeras universidades e comunidades educativas em todo o mundo, revelando resultados assombrosos.

Em Nova Iorque, conforme foi descoberto que muitos alunos estavam a usar os seus minicomputadores para enviarem para os seus camaradas de classe soluções para exames, ou descarregarem filmes pornográficos, e até interferirem perturbadoramente no comércio local, foram apertadas as medidas de proibições internéticas. Mas rapidamente as crianças conseguiram contornar as proibições técnicas elementares, e ainda publicaram na internet o método para outras fazerem o mesmo.

Além disso, em dias de provas, a rede de internet sofria colapsos por causa dos milhares de alunos que tinham os olhos cravados em seus mini-ecrãs. Assim, a exemplo de muitas outras escolas,
as autoridades decidiram recolher as máquinas, devido a demonstrarem ser uma decepção educacional.

Outras autoridades atestaram que após setes anos não havia qualquer evidência de um impacto positivo sobre o rendimento escolar, sendo que os computadores tinham provocado sobretudo uma dispersão para a aprendizagem. O abandono dos computadores durante trabalhos escolares e o crescente uso abusivo para fins particulares, mais a insuficiente preparação dos professores e os enormes encargos financeiros, forçaram por fim os próprios professores a boicotar o seu uso. Também um estudo do Departamento Nacional de Educação dos EUA demonstrou que não havia diferença no sucesso académico entre estudantes que anteriormente usaram, ou não, programas computerizados para a aprendizagem das disciplinas mais críticas: a matemática e a leitura.

Uma pesquisa realizada pelos Drs. Clotfeiler, Ladd e Vigdor, da Harvard University, entre quase 1 milhão de alunos, revelou que os melhores resultados em matemática e leitura foram alcançados por crianças que não tinham acesso a computadores em casa. Entre alunos com computadores, o acesso à internet não revelou quaisquer benefícios adicionais. Além disso, os resultados indicaram que o acesso livre a computadores em casa resultaria contra-produtivo para os esforços de reduzir as disparidades raciais, sociais e económicas entre os alunos.

Uwe Buermann, colaborador científico do Instituto Ipsum e docente de Ciências Computacionais em Kiel, sublinhou que os meios electrónicos presentes na vida de uma grande parte da população infantil são cada vez mais ingenuamente considerados pelos pais como brinquedos, tornando-se assim algo que as crianças podem usar a bel-prazer. Conforme elas mostram depois uma aparente habilidade superior à dos adultos para lidar com semelhantes “brinquedos”, muitos pais e educadores ficam confortados e deixam de interessar-se pelos seus efeitos negativos, imaginando que são coisas inofensivas e infantis. Entretanto, inúmeros estudos rigorosos já atestaram que o convívio prematuro de crianças em idade primária com computadores e tecnologias de comunicação, impede de maneira notável o desenvolvimento de muitas capacidades e habilidades, sendo precisamente essas crianças que posteriormente sofrerão de uma limitação nas suas chances pessoais e profissionais, ficando dependentes para o resto da vida.

Nas escolas, cada vez mais crianças mostram debilidades do tipo Distúrbio de Hiperactividade e Défice de Atenção (DHDA). A neurobiologia já atestou que em numerosos casos trata-se de danos psicológicos e orgânicos derivados do consumo de meios electrónicos
na primeira fase da infância. A frase “Os computadores ensinam as crianças a lidar com computadores” é muito popular entre os apóstolos pró-digitais, mas imaginar que isto já constitui uma preparação para a vida constitui uma ilusão bastante elementar. O que as crianças em idade pré-pubertária realmente aprendem com os computadores é a mera manipulação dos mesmos, o que não deve ser confundido com uma competência medial. Uma verdadeira competência medial exige suficiente capacidade de auto-avaliação para o uso individual de qualquer aparelhagem, mais uma criatividade bem desenvolvida, e ainda um saudável discernimento crítico acerca dos conteúdos – coisas que as crianças só alcançam mais tarde.

Na Universidade de Munique, um estudo sobre o meio-ambiente computacional familiar e escolar, realizado pelos Drs. Fuchs e Woessmann com o patrocínio da Volkswagen, concluíu que a mera presença de um computador em casa está negativamente relacionada com o rendimento escolar. A existência de computadores na escola demonstrou uma relação insignificante com
o desempenho geral dos alunos. A disponibilidade da internet na escola mostrou inicialmente algum efeito, mas o mesmo degradava-se rapidamente conforme aumentava o número de visitas internéticas por semana. O estudo veio confirmar anteriores pesquisas internacionais que já haviam determinado resultados decepcionantes para os computadores, em termos de rendimento educacional. Os autores acabaram por concluir que, onde quer que os computadores sejam aplicados para substituir outros tipos de instrução, quem sai prejudicado é o aluno.

Entre muitos pais e educadores, espalhou-se a crença de que deixar crianças em frente
de qualquer aparelho de televisão, vídeo, etc. contribuirá pelo menos para torná-las mais aptas
para lidar com computadores e outros aparelhos, quando mais tarde entrarem para a escola.
Os Drs. Zimmerman e Christakis, da University of Washington, atestaram pelo contrário que
as populares séries de vídeos infantis estão a fazer mais mal do que bem, especialmente para crianças com dificuldades de desenvolvimento da linguagem. As crianças sofrem um efeito exactamente inverso, deixando de aprender novos vocábulos. Esse resultado negativo, mesmo quando os programas vêm apresentados como educativos, foi verificado também na Faculdade
de Medicina da University of New Mexico. Os pesquisadores emitiram uma condenação categórica: a exposição prematura de crianças a programas audiovisuais só pode produzir
o aparecimento de uma geração de crianças hiper-estimuladas e posteriormente deficitárias em termos de concentração.

Na Universidade Tufts de Massachusetts, o Dr. Elkind estudou durante muitos anos
o desenvolvimento de crianças, verificando que a habilidade lúdica (brincadeiras e divertimentos naturais) está simplesmente a desaparecer, sob o efeito conjugado de meios electrónicos e actividades sedentárias, e ainda uma crescente pressão dos educadores para que alunos do nível básico mostrem cada vez mais rapidamente resultados de cariz académico. Para milhões de crianças, a infância passou a designar um período da vida confinado a quatro paredes. Até jardins de infância estão a ser cada vez mais transformados em verdadeiras escolinhas academificadas, onde as crianças são prematuramente tratadas como mini-adultos, sendo até submetidas a testes elementares e recebendo tarefas para casa.

“Os efeitos sobre a posterior vida escolar e académica são desastrosos. Ao lidar com ciências e matemática, por exemplo, as crianças sentem-se mais tarde empobrecidas em termos de imaginação e criatividade”, comentou o Dr. Elkind. Também o Dr. Bob Marvin, na University
of Virginia, salientou que décadas de pesquisas já demonstraram que as brincadeiras e as puras vivências fora das salas de aula são aquelas que colaboram mais decisivamente para as futuras habilidades académicas adultas, e para uma competência de aprendizagem para o resto da vida.

No Depto. de Ciência de Computação da Universidade de São Paulo, o Dr. Valdemar Setzer vem estudando há muitos anos o tema dos Meios Electrónicos e Educação (ver o interessantíssimo livro com o mesmo título, ISBN 8586303917). Consultado acerca do projecto Magalhães, ele declarou que semelhante medida resultará quase só inútil, ou altamente prejudicial para crianças e adolescentes. A distorção introduzida no modo de pensar, aliada aos factores mais comumente discutidos, como a perda do tempo para actividades livres, os perigos da internet, e a falta de um auto-controlo que só se alcança mais tarde, acabam por prejudicar o rendimento escolar. Durante a última Multiconferência Mundial sobre Sistemia, Cibernética e Informática ele referiu como a totalidade do mundo educativo, a nível internacional, está hoje carente de uma profunda reforma, reforma essa que deve instituir uma intensificada humanização, e não a introdução de cada vez mais tecnologia. O tema pode ser consultado em “www.ime.usp.br/~vwsetzer/pals/palestras” que contém extenso material em língua portuguesa.

O que está em causa não é só a perda da habilidade de escrever à mão, ou a necessidade de milhões de crianças em breve terem que usar óculos para compensar a deterioração da visão.
O fenómeno do uso irrestrito de meios electrónicos entre as crianças na fase pré-pubertária equivale a uma verdadeira deturpação do nosso universo infantil, uma vez que os imensos danos psíquicos e orgânicos provocados a longo termo ocorrem precisamente durante os delicados primeiros passos da formação das almas infantis, prejudicando-as definitivamente no seu desenvolvimento harmónico e saudável. Conforme o Dr. Setzer comentou com palavras rigorosas: “Isto só poderá levar ao aparecimento de adultos anti-sociais, com ideias fixas, passivos, fanáticos e pobres em forças de compaixão e criatividade”.

EFEITOS

Os efeitos complexos comprovadamente perniciosos que os meios electrónicos exercem indelevelmente sobre as almas infantis durante o septénio pré-pubertário são:

(1) Inducão de uma admiração desmesurada por máquinas, conforme o complexo funcionamento
dos computadores permanece incógnito.

(2) Estímulo para a ideia que máquinas dotadas de “inteligência artificial” podem em muitos
casos ser mais perfeitas do que seres humanos.

(3) Cultivo de uma concepção materialista do mundo, com uma visão fatalística da humanidade
e da vida, do tipo “tudo é previsível e programável”.

(4) Inclinação para uma estratégia de vida baseada na fé computacional de “dividir
para conquistar”, ou seja, subdividir sempre um problema em partes menores, a fim de
resolvê-las separadamente – o que resulta desastroso quando aplicado a seres humanos.

(5) Deterioração dos valores de sociabilidade, uma vez que os computadores são usados
individualmente e os contactos – via internet, blogues, skype, emails, etc. – permanecem sob
a máscara cibernética.

(6) Provocação de impulsos tendentes a realizar tudo na vida rapidamente e com variadas acções
em simultâneo.

(7) Debilitação das capacidades de concentração mental, contemplação e paciência.

(8) Degeneração da memória e distorção da capacidade do pensamento criativo, conforme deixa
de ser necessário memorizar o que é facilmente arquivável em gigantescas memórias
electrónicas.

(9) Incitamento à utopia de “aprender é fácil como brincar”, devido à generalizada concepção
infantilóide (por adultos) dos softwares.

(10) Eventualmente degeneração de funções neurocerebrais, devido à constante exposição
a campos electromagnéticos nas proximidades da cabeça.


* * *

Apenas com estes breves dados, pais conscienciosos já estarão habilitados a repensar o uso pretendido para aparelhos electrónicos na educação das suas crianças em idade pré-pubertária. É útil também lembrar a autoridade que pais detêm em assuntos de educação, conforme está lapidarmente estabelecido em dois documentos internacionais fundamentais:

– A Declaração Universal dos Direitos Humanos, co-assinada por Portugal junto à ONU, estabelece no artigo 26/3: «Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de educação a dar aos filhos».

– A Convenção de Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, co-assinada por Portugal junto ao Conselho da Europa, estabelece no artigo 2 do protocolo: «O Estado, no exercício das funções que tem de assumir no campo da educação e do ensino, respeitará o direito dos pais a assegurar aquela educação e ensino consoante as suas convicções religiosas e filosóficas».

Informações completas em
www.defesadacrianca.net
Por
Manuela Pinheiro em 23 de Março de 2009

Académica, ontem, hoje e amanhã


quinta-feira, março 12, 2009

Faleceu o João Mesquita


Dezembro de 2005, Quinta das Flores - Coimbra
(depois de uma reunião sobre o livro "Académica - História do Futebol")


O mais profundo pesar.

Descansa em paz, Amigo.


INFORMAÇÃO DO DOUTOR ROGÉRIO PUGA LEAL

O corpo do João estará hoje na Igreja de S. João Evangelista, no topo da Alameda (Rua Barão de Sabrosa). Amanhã, haverá cerimónia às 9h30 e o funeral será na Lousã.



* * * * * *

NOTÍCIA DO PÚBLICO ON-LINE


Morreu o jornalista João Mesquita
12.03.2009 - 09h34
Morreu esta madrugada, vítima de cancro, o jornalista João Mesquita, ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas e jornalista do PÚBLICO desde à sua fundação até 31 de Agosto de 1993.

João Mesquita nasceu em Coimbra, a 3 de Junho de 1957. Foi jornalista profissional desde os 22 anos e presidiu à direcção do Sindicato dos Jornalistas, entre 1989 e 1993.

Em Fevereiro passado, João Mesquita esteve internado durante vários dias no serviço de Pneumologia do Hospital Pulido Valente, em Lisboa, de onde acabou por sair no dia 26. Na altura, amigos e conhecidos criaram o grupo "Amigos do João Mesquita" no Facebook.


TEXTO DA AGÊNCIA LUSA

Lisboa, 12 Mar (Lusa) - O jornalista João Mesquita, 51 anos, presidente do Sindicato dos Jornalistas entre 1989 e 1993, morreu hoje de madrugada em casa, vítima de doença pulmonar, disse à Lusa fonte da família.
João Mesquita, natural de Coimbra, onde nasceu a 03 de Junho de 1957, era um indefectível adepto da Académica, tendo em 2008 lançado, em parceira com João Santana, o livro "Académica - História do Futebol", além de outros livros relacionados com a "Briosa".
Como jornalista, iniciou a carreira na Voz do Povo, órgão oficial da União Democrática Popular (UDP), partido que mais tarde se fundiu com outras organizações, dando origem ao Bloco de Esquerda.
Passou depois pelo extinto Notícias da Tarde, Jornal de Notícias, Semanário, Público, Jornal as Beiras (Coimbra), Independente e pelo também desaparecido vespertino A Capital.
Nos últimos anos, João Mesquita colaborava no Expresso e editava a revista Rua Larga da Universidade de Coimbra.

COLABORAÇÃO NO "CENTRO"

Texto publicado no n.º 1 do quinzenário "Centro", no início de 2006, correspondendo a pedido que lhe fiz
(clique na imagem para ampliar)

MENSAGEM ENVIADA PARA A "MAILING-LIST" BRIOSA

«Quando cheguei a Coimbra, caloirinho, em 1991 eu gostava da Académica. Uma grande parte da minha família tinha estudado na Universidade (uma tradição já com várias gerações que espero venha a prosseguir com os meus miúdos), tinha tios e primos a viver em Coimbra...
Estas foram motivações para decidir que SÓ queria ir para Coimbra, não admitia outras alternativas...e tive a sorte de conseguir entrar...

Logo no primeiro mês e a seguir à latada (em 91 as aulas começaram muito tarde) fiz-me sócio do OAF e comecei a ir à bola. Depressa percebi que era totalmente ignorante em relação a muitas coisas do futebol da nossa Briosa.

Mas eis que descobri um tipo de bigode farfalhudo que sabia tudo e onde quer que eu fosse ver a “velhinha”, lá estava ele... Comecei a aproveitar para me cultivar e aprender...para mim, aquele era o meu ideal de Academista: um Homem de grande coração, que falava sempre com um grande entusiasmo e sempre generoso.

Vim para o Luxemburgo e passei a ir muito pouco ao futebol. Mas sempre que pude ir ver a nossa Académica continuei a ver o João, sempre presente. A última vez que vi um jogo, em Alvalade no ano passado, lá estava ele, igual a si próprio.
Depois tive o prazer de o ver na TV a falar do seu livro...sempre com aquele entusiasmo que o caracterizava quando falava da sua/nossa Académica.

A Académica perdeu provavelmente o seu melhor adepto. Nós perdemos um amigo e um companheiro. Mas a sua memória ocupará sempre um espaço de destaque no na galeria de notáveis da nossa Académica que tanto precisa de outros como ele.

Este domingo será um domingo diferente, faltará um grande bigode à entrada do estádio...

Para ti, João, o meu FRA!
Para vocês, companheiros de lista desde 2001, um grande abraço emocionado do vosso
Manuel Gaivão (Luxemburgo)»


TEXTO DE HENRIQUE MONTEIRO, DIRECTOR DO "EXPRESSO"

O camarada João Mesquita

O João foi um dos homens sérios que conheci. Não conheço assim tantos, infelizmente. Foi sério até à sua própria exaustão, prejudicou-se de ser sério, foi inflexivelmente sério. O João foi um dos homens de carácter que conheci.


Henrique Monteiro (*)
11:58 - Quinta-feira, 12 de Mar de 2009


Morreu o jornalista João Mesquita. Morreu o amigo e camarada que me acompanhou e que eu acompanhei desde os meus 17 anos. Primeiro numa luta juvenil contra a ditadura e a guerra colonial e por uma revolução impossível com uma ideologia esquerdista e irresponsável; depois, a partir do momento em que ambos rondávamos os 20 anos, no estágio e no primeiro emprego como jornalistas e, mais tarde, na direcção do Sindicato; por último, como profissionais, como homens com ideias diferentes, mas cumplicidades imensas. Como homens, que se respeitam como homens livres.

O João foi um dos homens sérios que conheci. Não conheço assim tantos, infelizmente. Foi sério até à sua própria exaustão, prejudicou-se de ser sério, foi inflexivelmente sério. O João foi um dos homens de carácter que conheci. Um carácter amistoso de bon vivant à mistura com uma humildade republicana e laica de revolucionário. O João era uma contradição, daquelas boas contradições que nos dizem que um ser é tão livre que derrota as prisões e os preconceitos. Não seria possível compreender inteiramente o João sem entender o seu percurso, uma vez que toda a sua vida breve (faleceu com 51 anos) foi feita de amizades e cumplicidades que o marcaram, ao mesmo tempo que de acções suas que marcaram os que o foram rodeando.

Comecei a trabalhar no mesmo dia e no mesmo jornal – “A Voz do Povo” - que o João Mesquita. Aliás fôramos os dois convidados, após o jornal romper com a UDP, para reforçar os quadros redactoriais. Experiência? Tínhamos a do Movimento Associativo. Andáramos os dois a fugir da polícia (e a ser uma vez presos por ela) e a fazer conspirações mais ou menos pueris - de que fizeram parte a tentativa de raptar um informador da PIDE no movimento estudantil, ou a libertação de um estudante preso, comité onde ambos servimos às ordens de Nuno Crato. O Director do Jornal era, na altura, João Carlos Espada, que o comandava com 24 anos, e os chefes de redacção eram José Manuel Fernandes e Nuno Pacheco. Somos todos amigos, hoje, e sei bem como todos sentimos a morte do João.

Claro que o jornal faliu. Mais tarde, consegui um emprego na delegação em Lisboa de um vespertino do Porto, propriedade do “Jornal de Notícias” - o “Notícias da Tarde”. Passados uns meses, quando soube que o meu chefe - e mestre da tarimba, Fernando Antunes - , precisava de um repórter parlamentar, propus-lhe o Mesquita. Ele desempenhou essas funções com qualidade e originalidade e penso que foi aí que, verdadeiramente, ele foi reconhecido como bom e sólido jornalista que foi.

Passámos ambos para o “Jornal de Notícias”, de onde eu segui para “O Jornal” e ele, anos depois, para o “Público”. A sua carreira passou, ainda, pelo “Independente” e por colaborações em diversos jornais, as últimas das quais aqui no “Expresso”, onde ainda há um mês (14 de Fevereiro) publicara um texto no Actual. Hoje mesmo, iria fazer uma reportagem para o mesmo caderno...

Fui também eu que propus ao José Pedro Castanheira o nome do João Mesquita para a Direcção do Sindicato. O João entrou como secretário e foi exemplar. Nessa época, como, anos depois, nos tempos em que ele próprio foi o presidente do SJ, o Sindicato ainda era uma força independente e irreverente comandada por jornalistas. O João, que presidiu de 1989 a 1993, vinha de uma tradição de presidentes como Cáceres Monteiro, Cesário Borga, José Pedro Castanheira, que conferiam respeitabilidade e responsabilidade à associação, muito longe da burocracia de jornalistas cinzentos em que se tornou hoje em dia.

O João não pensava como eu, nunca o escondemos um ao outro. Mas era tolerante como só pode ser tolerante quem vinha de uma família que pensava o contrário dele. Nascido em Coimbra (e exaltado adepto da Briosa, tendo escrito uma excelente história da Académica), veio cedo para Lisboa e, ainda rapazes, em casa dele, via coexistirem os posters de Mão Zedong com cartazes de Freitas do Amaral (o seu irmão era feroz apoiante do recém-criado CDS). O seu pai, o já falecido Conselheiro Costa de Mesquita, chegou a ser do Tribunal Constitucional, indicado pelos centristas. Mas nada disto atrapalhava o João, nem as minhas “reaccionaradas”, como ele lhes chamava. «És um reaccionário porreiro», disse-me ele há uns anos... E eu respondi-lhe «E tu és o melhor esquerdalho do mundo».

Dávamo-nos bem. Éramos amigos, profundamente amigos, e hoje só lamento o tempo que tive para estar com ele e não estive, a possibilidade que tive de falar mais com ele e não o fiz.

A vida e a família (o João era casado com Clara Vasconcelos, também jornalista, e deixa uma filha com 10 anos) afastaram-nos, mas nunca quebraram os laços solidários dos conspiradores juvenis.

A morte tenta cortar esse nó, mas eu, que ao contrário do João sou crente, tenho esperança de ainda o encontrar algures.

Deus gosta muito mais de pessoas como o João, do que daqueles que apenas sabem utilizar o seu nome para pedir desculpa pelo mal que fazem aos outros.

E o João nunca, mas nunca, fez mal a ninguém. Pelo contrário, deixa um rasto de amigos em todas as latitudes possíveis.

(*) “Expresso on-line”




TEXTO NO "SITE" ESQUERDA.NET

Morreu João Mesquita

João Mesquita, 51 anos, presidente do Sindicato dos Jornalistas entre 1989 e 1993, faleceu na madrugada desta quinta feira. Fundador do Bloco de Esquerda, Mesquita iniciou a carreira jornalística na Voz do Povo, órgão oficial da União Democrática Popular (UDP) e viria mais tarde a colaborar no Combate, ligado ao PSR.

João Mesquita, nasceu em Coimbra a 3 de Junho de 1957. Faleceu na madrugada desta quinta feira, na sua residência em Lisboa, vítima de doença pulmonar. O corpo está a partir das 12 horas na Igreja S.João Evangelista (Alto Pina, Lisboa) e parte amanhã (sexta feira) às 13h em direcção à Lousã, onde se realiza o funeral.

Nos últimos anos, o jornalista colaborava no jornal Expresso e editava a revista Rua Larga da Universidade de Coimbra. João Mesquita iniciou a sua carreira na Voz do Povo, órgão oficial da União Democrática Popular (UDP), passando depois pelo extinto Notícias da Tarde, Jornal de Notícias, Semanário, Público, Jornal as Beiras (Coimbra), Independente e A Capital, entretanto também extinto.

No prefácio ao livro "Crónicas e Contos de Combate", recentemente editado pela APSR, João Mesquita conta a história do nascimento de um novo projecto militante na imprensa portuguesa: o jornal "Combate" inaugurava uma nova fórmula na altura em que o cavaquismo atingia o seu auge, em 1987.

Escreveu João Mesquita sobre esse período: "Muita água passou, entretanto, por baixo das pontes. Mas surpreendo-vos muito se disser que permanecem intactas em mim quase todas as razões que me conduziram às conversas de 1987 com Francisco Louçã? Hoje como ontem (e, actualmente, já nem há o "Diário de Lisboa" e o "Público" é "outra coisa", a esquerda precisa de um jornal de massas que noticie o que os outros não noticiam, que discuta o que os outros não discutem, que afirme o que os outros não afirmam, que descubra o que os outros não descobrem - e que, ainda por cima, faça tudo isso de uma forma bonita, irreverente, polémica".

João Mesquita foi um dos fundadores do Bloco de Esquerda.



TESTEMUNHO DE ANDRÉ CAMPOS NEVES

«Ninguém é igual a ninguém. Todo o ser humano é um estranho ímpar disse um dia o grande Carlos Drummond de Andrade. O João Mesquita, era ele próprio. Solidário. Amigo. Inconformado, lutador. Académico dos quatro costados, não se revia em unanimismos fáceis,desertos de ideias. Era uma apaixonado pela sua profisão, um dedicado amigo, um Pai e marido exemplares, rejeitando capitulacionismos conformistas, alguém - como disse o poeta - capaz de resistir, capaz de dizer não. O seu livro (e de João Santana) sobre a história da Académica, é um comovente desfilar de memórias passadas de uma Instituição que ele amou como poucos. Uma obra para a posteridade. Uma Bíblia de quem professa a "religião" Briosa e a sua inigualáel e imperecível história secular. Quis o destino que a doença terrível que o vitimou e nos deixou todos mais pobres, fosse diagnosticada no dia seguinte ao do fecho do livro para o prelo. A Joana ficará orgulhosa do Pai que teve e a Clara guardará do João a sua alegria contagiante, a sua bondade, o seu exemplo. Como Valery eu digo, morrem cedo, aqueles que os deuses amam. Um grande abraço par ti onde quer que estejas e a certeza de que por um dia destes te estarei a abraçar.

André Augusto Campos Neves»




OPINIÃO DE JOSÉ MANUEL FERNANDES, DIRECTOR DO "PÚBLICO"

Morreu um homem de carácter, adeus João Mesquita

12.03.2009 - 13h37
José Manuel Fernandes

A notícia da morte do João Mesquita chegou-me hoje de manhã, bem cedo. Por um amigo comum, o Henrique Monteiro, director do “Expresso”. Via Twitter. E, quando ainda se misturavam as emoções e as memórias, partilhei, também no Twitter, o que sentia: morrera um homem de carácter. Os 140 caracteres não me permitiram acrescentar que essa é uma qualidade cada vez mais rara nos dias que correm, mas que o João tinha como poucas pessoas que conheço.

Conheci-o aí uns dois anos antes do 25 de Abril, tínhamos ambos 15 anos, nas reuniões do MAEESL, a associação de estudantes do ensino secundário de Lisboa, então semi-legal. Usava então o cabelo pelo meio das costas (até ao dia 16 de Dezembro de 1973, em que eu, ele e mais uns 160 estudantes fomos presos por uma noite e todos os rapazes saíram com o cabelo rapado...) e fazia parte do pequeno grupo que aguentava sempre até ao fim nas reuniões mirabolantes que entravam pela noite dentro. Esses anos e os da revolução vivemo-los com uma intensidade hoje difícil de imaginar, e o tempo em que, já militantes de uma organização clandestina, fui controleiro dele, deixou-me recordações poderosas sobre essa espécie de mundo paralelo em que viviam os – literalmente – “maoistas de calções”.

Estivemos depois juntos na fase final da “Voz do Povo”, com o João Carlos Espada, o Nuno Pacheco, o Henrique Monteiro. Já nos estávamos a afastar da UDP, uma das organizações que esteve na base do actual Bloco de Esquerda, e o jornal sobreviveria pouco tempo. Na década de 1980 andámos por jornais diferentes – foi quando ele passou pelo efémero “Notícias da Tarde” e, depois, pelo “Jornal de Notícias” – até que nos reencontramos, profissionalmente, na fundação do PÚBLICO. Nessa altura era ele presidente do Sindicato dos Jornalistas, o último em quem me revi. Não porque continuássemos a pensar da mesma maneira, pois cada um de nós, “os da Voz do Povo”, seguira o seu caminho próprio de homem livre e que pensa pela sua própria cabeça. Mais: o tempo que passáramos juntos nessas organizações mostrara-nos como é importante respeitar as ideias alheias e fizera-nos aprender o valor de uma boa discussão. E discutir com o João era sempre coisa para umas horas, que ele nunca desistia.

Quando quis regressar à Coimbra em que nascera em 1957 tive pena que abandonasse o PÚBLICO e começámos a ver-nos de forma muito mais espaçada. Guardo, contudo, uma agradável recordação da última noitada sem fim, vivida na Tocha depois de um colóquio sobre os 25 anos do 25 de Abril. A vida da sua Académica, o clube por que realmente torcia e sofria, ocupou boa parte da conversa partilhada com o anfitrião, Júlio de Oliveira, presidente da Junta de Freguesia, e onde o actual bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto, fez jus à sua fama de ser quase impossível de calar.

Mas tudo isto são memórias soltas de alguém que, como pessoa e como jornalista, se distinguia pelo seu carácter, pela sua frontalidade, pela sua seriedade. Isso chegou a prejudicá-lo na carreira, nomeadamente nos anos que passou em Coimbra, pois era dos que não fazia fretes. De espécie alguma. Assim como não transmitia recados. Ele era, como já disse, um homem livre e fiel àquilo em que acreditava. Também por isso trabalhou nos últimos anos como "free-lance".

Morreu na madrugada de hoje, em casa, na cama, ao lado da Clara e deixou uma filha com 10 anos. Morreu de cancro e os seus muitos amigos sabiam que um dia receberiam a notícia que hoje nos tocou à porta. Mas nunca estamos preparados para esse momento. Eu, pelo menos, não estava. Adeus João, e que a referência da tua integridade perdure e ajude todos os jornalistas que te conheceram a escolherem bem no momento das escolhas difíceis.



ENTREVISTA (*)

João Mesquita: Uma ideologia para o jornalismo

12.03.2009 - 13h54
José Luiz Fernandes/Perfil Sociológico do Jornalista Português



O local para a nossa conversa dificilmente poderia ser outro que não esta casa comum – o Sindicato dos Jornalistas, a cuja direcção presidiu de 1989 a 1992.

João Mesquita é um exemplo do jornalista que chega à profissão, após o 25 de Abril, pela via da militância política. É também exemplo do jornalista qualificado e experiente que as redacções portuguesas menosprezam. Aos 49 anos e meio, à data da entrevista, carrega mais de três anos de desemprego e, como admite, vê poucas possibilidades de voltar a uma redacção.

Guarda excelente memória de acontecimentos e respectivos protagonistas e mantém-se frontal e crítico. A sua visão dos problemas do jornalismo dos anos 80 e 90 é esclarecedora, inclusive do presente. Fala-nos de como os jornalistas intentaram, nessa época de charneira, “uma nova prática jornalística, um jornalismo pós-Censura e pós-PREC”. E como o poder se assustou, quando ouviu falar numa ideologia da profissão, e logo “pensou mais na domesticação dos jornalistas do que na sua responsabilização. Dá a ideia de que ainda hoje continua assustado…”.

Era João Mesquita presidente da direcção sindical quando um grupo de profissionais lançou um movimento para a criação da Ordem dos Jornalistas. O Sindicato promoveu, em 1992, um referendo aberto a todos os profissionais, que se pronunciaram maioritariamente contra a hipótese. João Mesquita continua a considerar uma Ordem “completamente desadequada à profissão”, cujo membros, na generalidade, não isenta de co-responsabilidade pela crise actual do jornalismo. “As redacções pensam pouco, agem ainda menos” – afirmação que nos deixa, para reflexão dos jornalistas.

Foi “um pouco por acaso” que João Mesquita nasceu em Coimbra. Seu pai, juiz de Direito, fora transferido de Tomar para o Porto e a mãe, então na fase final da gravidez, foi para casa dos pais, na cidade do Mondego, onde o avô era inspector do Magistério Primário.

Nascido a 3 de Junho de 1957, João Bernardo Bigotte da Costa de Mesquita viveu a infância em várias localidades e regiões, de acordo com as colocações do pai. Sai do Porto, com menos de dois anos, para Santa Maria, nos Açores; voltará às Beiras, primeiro Gouveia, depois Castelo Branco; seguir-se-á Torres Vedras e aos 14 anos chega a Lisboa, quando o magistrado é colocado na Procuradoria-Geral da República.

Corria o ano de 1971 e é matriculado no Liceu Camões, para fazer o quinto ano, mas como recorda, “nunca consegui fazer nada: no primeiro ano fui suspenso, no segundo fui expulso. Nessa altura já desenvolvia actividade associativa, fui fundador do núcleo do Camões do Movimento Associativo do Ensino Secundário de Lisboa (MAESL). Além disso, era um bocado mal comportado, de facto. Depois, tive problemas para me conseguir inscrever noutro liceu. Nenhum me aceitava, até que fui acolhido no Passos Manuel, para onde iam os ‘marginais’ todos: os sociais e os políticos”.

No Liceu Passos Manuel, João Mesquita envolve-se ainda mais na actividade política. Organiza e participa em meetings contra a guerra colonial, que levam a polícia a invadir o liceu. A 16 de Dezembro de 1973 é um dos 164 estudantes do ensino secundário presos na Faculdade de Medicina de Lisboa. É no Passos Manuel que vive o 25 de Abril de 1974. “Logo no dia 26, criámos uma comissão pró-associação de estudantes, depois entrei na direcção da associação e na actividade política e pouco tempo passava nas aulas. Lá deixei o liceu, em 1978, embora com duas disciplinas que nunca conclui”.

Abandona o liceu e vai fazer “trabalho político para as comissões de moradores dos bairros de lata” até 1979, quando o convidam para o jornal A Voz do Povo, que desde 1974 tinha sido o órgão oficioso da UDP . “Nesse ano houve uma cisão na UDP. Saíram bastantes pessoas, entre as quais eu e a maioria dos redactores do jornal, que decidiram mantê-lo e transformá-lo num projecto mais profissional. Sou convidado nesse contexto, pelo director, que era o João Carlos Espada . No âmbito do meu trabalho político fazia frequentemente comunicados e outros documentos, tanto no CMLP, no PCP(R) e na UJCR , como na UDP, e adquirira a fama de que escrevia com algum desembaraço. Não depressa, que eu nunca escrevi depressa, mas com algum desembaraço”.

O convite surgia ao encontro da sua aspiração a ser jornalista e de imediato o aceitou. “Não conhecia a profissão, não conhecia o meio, não conhecia jornalistas, tinha uma ideia muito reduzida do que era o jornalismo, mas gostava, aí desde os meus 12 anos, de fazer alguma coisa que envolvesse escrever, perguntar, ir ver. Fui sempre muito curioso e seduzia-me poder ir ver e perguntar de maneira diferente do comum das pessoas, ser os olhos, os ouvidos, o entendimento do leitor… Claro, seduzia-me também a possibilidade de intervenção social”.

O seu gosto pelos jornais começara logo na meninice. João Mesquita ainda hoje se vê, recorda, “deitado no chão da sala, com os jornais abertos, naquele formato grande… Posso dizer que, além da aprendizagem escolar, aprendi a ler pelos jornais, sobretudo com A Bola e O Primeiro de Janeiro, mais tarde com O Século, que eram os jornais que se compravam em casa dos meus pais. Depois, quando passei a ter uns tostões meus comprava tudo o que era jornal de oposição ao regime: Comércio do Funchal, Jornal do Centro, Notícias da Amadora, República…”.

Também o gosto pela escrita vinha desde garoto, muito por influência de um tio e padrinho, com quem passava temporadas grandes nas férias. “Ele estava uma boa parte do tempo a escrever e a ler e nisso fui muito influenciado por ele”. O tio é o ensaísta e crítico literário João Bigotte Chorão, de quem o entrevistado se foi, progressivamente, distanciando nos planos político, ideológico e religioso. Mas a admiração, pessoal e intelectual, nunca a perdeu e nos últimos anos voltaram a encontrar-se frequentemente.

As primícias do futuro jornalista ocorrem em Castelo Branco, onde, nas franjas da Juventude Estudantil Católica, a JEC, participa na edição de um jornal que depois era vendido à saída do mercado, uma vez por mês. “Se a memória não me trai, chamava-se Clube XXI”.

A nova série de A Voz do Povo, jornal de intervenção política de esquerda radical, mas organicamente independente de partidos, durou até 1981. Os tempos já eram adversos a projectos deste tipo, como reconhece hoje João Mesquita: “Os ecos do PREC desaparecem, a AD ganha as eleições, há uma viragem geral à direita e nós não tivemos a percepção imediata das transformações que estavam a ocorrer na sociedade portuguesa. O jornal vivia cercado do ponto de vista financeiro, dependente das poucas assinaturas e vendas, mais de meia dúzia de anúncios. Ainda se criou uma Liga de Amigos, com pessoas de esquerda que tinham dinheiro, mas só deu para aguentar o jornal dois anos”.

O fim deste jornal, como doutros com forte marca política surgidos após o 25 de Abril, suscita a questão da sua recepção pelos públicos, insuficiente para lhes viabilizar a publicação. João Mesquita admite que, em larga medida, faziam um jornal para os seus autores. “O público era o pretexto para fazermos um jornal de acordo com as nossas convicções, com o que nós achávamos que devia ser um jornal naquele momento histórico. A nossa formação jornalística era muito fraca, havia apenas dois ou três redactores com alguma preparação: o Eduardo Miragaia , que já tinha trabalhado, nomeadamente, no República; o Nuno Crato , que tinha então publicado um manual de jornalismo… Nem eu, nem, por exemplo, o José Manuel Fernandes , o Nuno Pacheco , o Henrique Monteiro ou o Manuel Falcão tínhamos formação jornalística. Fomos aprendendo, na prática, e através de leituras e conversas”.

Dessa época, de jornalista em formação, reteve o ensinamento de que “é preciso pensar mais no público do que em nós, jornalistas, pensar mais em quem lê os jornais do que em quem os faz”.

Olhando para os meios de informação de hoje, acha que esse desfasamento se mantém. “Se há crítica que faço aos jornais, e aos outros meios, é a manutenção desse divórcio entre quem faz e quem lê, vê ou ouve. A televisão procura satisfazer aquilo que supostamente são os gostos, primários e imediatos, dos públicos, mas isso não responde às necessidades de informação dos cidadãos. Continua-se a fazer uma informação muito centrada em Lisboa e um pouco no Porto, o resto do país é ignorado. Faz-se informação muito dirigida à classe alta e à classe média alta, muito divorciada das outras camadas da população”.

Um desempregado, como é João Mesquita, “ao olhar para um jornal terá com frequência a sensação de que estão a gozar com ele. Sei isto por experiência própria. Porque boa parte do que se publica parece que tem a ver com outra realidade ou com outro país: é o ministro a decretar o fim da crise, é o ministro a anunciar a recuperação do emprego… Quando aparece uma notícia do encerramento de uma fábrica, que lança centenas de trabalhadores no desemprego e afecta a vida de milhares de pessoas, a televisão até mostra o desespero das pessoas – claro que numa óptica de espectáculo… –, mas tudo o que levou àquela situação é silenciado e nos jornais também não é explicado. Lembro-me do poeta Vinicius de Moraes, que diz que a dor da gente não vem no jornal. Não vem nos jornais, não!”.

Quer isto dizer que, na opinião do entrevistado, o jornalismo português não melhorou?

“O que melhorou foi a formação técnica e académica dos jornalistas, mas a isso não correspondeu uma melhor formação social e ética dos profissionais. Na minha geração – e não estou a elogiar, mas a constatar – éramos uns autodidactas, uns ‘curiosos’ do jornalismo. Vínhamos para o jornalismo basicamente pelo gosto de escrever e pela paixão de intervir. Éramos pessoas comprometidas socialmente, tínhamos intervenção cívica e política e experiência de vida – desse ponto de vista receio bastante que se tenha regredido e que hoje, genericamente falando, se venha para o jornalismo por motivos menos nobres do que aqueles que nos trouxeram. A forma de encarar a profissão hoje será muito mais a de uma carreira e, consequentemente, como um meio de promoção, de fazer dinheiro e ganhar estatuto. Nós não pensávamos na carreira, em sermos directores, em sermos estrelas… Não tínhamos ambições dessas”.

O jornalismo pós-Censura e pós-PREC

Após o fim de A Voz do Povo, João Mesquita esteve uns largos meses desempregado, até entrar para a delegação em Lisboa do Notícias da Tarde, um vespertino com sede no Porto. Foi encarregado de fazer a cobertura do Parlamento, tarefa que foi predominante na sua actividade durante sete anos, inclusive nos jornais onde esteve posteriormente. E que lhe permitiu perceber a facilidade com que se pode criar um distanciamento entre jornalistas e leitores. “Era – e continuo a ser – defensor da especialização, mas apercebi-me de que a hiperespecialização pode criar insensibilidade e alheamento face a outras realidades”.

A Assembleia da República é apontada como ambiente propiciador duma certa promiscuidade entre jornalistas e políticos, com reflexos negativos no condicionamento do jornalismo de política. João Mesquita acha que o risco da promiscuidade se acentuou, quando comparado com os anos 80. “Nessa época, havia um relacionamento muito próximo entre os jornalistas, os deputados e os funcionários do Parlamento, que derivava muito do tempo que ali passávamos: dias a fio, semanas, meses, sessões que começavam num dia e acabavam na madrugada do dia seguinte. Mas, simultaneamente, havia nos jornalistas uma noção de independência muitíssimo grande. Já havia pressões, evidentemente, houve sempre pressões, mas na relação com os políticos havia muita discussão, muita crítica, nós interpelávamos os deputados e discutíamos com eles, e eles connosco, confrontávamos ideias. A relação era muito próxima, mas não deixava de haver independência e respeito mútuo. Ninguém se atrevia a convocar os jornalistas para falsas conferências de imprensa, onde se lêem comunicados ou se fazem declarações e não são permitidas perguntas. Quando um partido ou alguém queria comunicar alguma coisa mandavam um comunicado, um fax, ou lá o que fosse, à redacção e não passava pela cabeça de ninguém que não se pudessem fazer perguntas”.

Os anos 80 são a década em que o entrevistado se constrói como jornalista. Portanto, é a sua época de referência. Se isso o poderá levar à sobrevalorização de alguns aspectos do jornalismo de então, é certo que foi um período muito importante no jornalismo português. Procurava-se uma nova prática jornalística, um jornalismo pós-Censura e pós-PREC. Procurava-se tentando, experimentando, e reflectindo, como foi patente no 1.º Congresso dos Jornalistas Portugueses, realizado em Janeiro de 1983 e preparado durante o ano de 1982. Tal como no 2.º Congresso, em Novembro de 1986.

João Mesquita lembra que, “nessa altura, na crónica parlamentar, se estava a enveredar por um novo caminho, em que a peça jornalística deixava de ser um mero relato dos trabalhos da Assembleia. Estava a iniciar-se uma nova forma de tratar as instituições, sem o ‘oficialismo’ de antigamente e sem o ‘propagandismo’ dos tempos do PREC. Deste, devo dizer que considero que era inevitável. Não tenho a visão de que foram tempos horríveis para o jornalismo; horrível teria sido os jornalistas ficarem a assistir ao PREC como se não tivessem nada a ver com aquilo e nada estivesse a acontecer. Por vezes era difícil distinguir o jornalista do militante político, mas eram os tempos, aconteceu isso com toda a gente e em todas as profissões. Todos intervieram, uns mais outros menos, à sua maneira, mas todos intervieram”.

Essa demanda dum novo tipo de jornalismo, “a busca desse ponto de equilíbrio, precisava de ter sido acompanhada por reformas estruturais que não foram feitas”. Sem iludir as responsabilidades dos jornalistas, sobretudo por não terem tido a capacidade de constituir uma vontade colectiva suficiente que conduzisse a soluções e mantendo-se reféns de iniciativas individuais ou de pequenos grupos, João Mesquita recorda que, “no plano legislativo, com os governos AD e PSD dos anos 80 iniciou-se um ataque a aspectos que eram conquistas importantes, como a redução das competências dos conselhos de redacção e o fim do Conselho de Imprensa. Foi lançado o processo de privatização dos meios de comunicação públicos, muito pouco ponderado do ponto de vista das consequências que isso teria para o jornalismo; não as consequências para os jornalistas, mas as consequências para a formação da opinião pública. Não esqueçamos que tivemos um primeiro-ministro que dizia que não lia jornais. Na época começou-se a falar na ideologia da profissão e o poder assustou-se e pensou mais na domesticação dos jornalistas do que na sua responsabilização. Dá a ideia de que ainda hoje continua assustado…”

Dos congressos de jornalistas de 1983 e de 1986 saíram propostas muito concretas. Mas, considera João Mesquita, da parte do poder não houve resposta aos problemas que os profissionais colocaram. “Pelo contrário, houve uma escalada contra o exercício do jornalismo independente, contra os novos caminhos que se estavam a abrir. Os políticos, sobretudo os que exerceram funções governativas, têm pesadas responsabilidades na situação a que o jornalismo chegou. Mataram no ovo um caminho que estava a ser equacionado e podia ter trazido uma grande alteração de qualidade. Se calhar porque essa qualidade, com tudo o que implica, lhes metia medo”.

Mas, também, “os novos empresários da comunicação têm responsabilidades grandes na evolução deste quadro, nomeadamente os que usufruíram da privatização dos meios públicos. Após a melhoria acentuada das condições de trabalho, no período imediatamente a seguir ao 25 de Abril, a partir dos anos 80 voltámos a ter uma compressão muito grande, situação que só melhorou um pouco no princípio dos anos 90, com o lançamento do jornal Público e das televisões privadas. Mas durante dez anos andámos a ‘marcar passo’ e isso criou fenómenos perniciosos, como os duplos e triplos empregos. Os germes de muito do que aconteceu depois estão aí, nas questões não solucionadas na década de 80 e nos fenómenos criados no início dos anos 90”.

Fontes e dependências

O Notícias da Tarde não vingou num mercado já muito disputado por três vespertinos: A Capital, Diário de Lisboa e Diário Popular. Lançado pela empresa pública do Jornal de Notícias (JN), em 1982, no ano seguinte já enfrenta problemas de sobrevivência. A sua redacção, numa atitude reveladora da capacidade de intervenção que os jornalistas ainda tinham, pronuncia-se em plenário pela extinção do jornal com a integração dos postos de trabalho no conjunto da empresa. A administração decidirá a integração de cerca de 25% dos jornalistas nos quadros do JN e os outros numa nova publicação, o jornal desportivo O Jogo.

Integrado no JN, na redacção de Lisboa, João Mesquita esteve quatro ou cinco meses à espera dessa integração. “Nesse período, começo a colaborar com o Expresso e foi aí que conheci uma nova faceta da promiscuidade. Ao contrário de tudo aquilo a que eu estava habituado, no Expresso as fontes telefonavam para os jornalistas. Eu nunca tinha tido essa experiência; em A Voz do Povo e no Notícias da Tarde eram os jornalistas que tinham de andar atrás das fontes. No Expresso, recebia telefonemas das fontes, algumas das quais chegavam a dar indicações sobre a forma de publicação dos textos. Estive lá pouco tempo, portanto não deu para tirar conclusões, mas agora quando leio os livros do arquitecto Saraiva ou a história do PSD do professor Marcelo , percebo que as minhas suspeitas sobre a influência de certas fontes no jornal eram fundamentadas. Claro que, na generalidade, os jornalistas do Expresso não eram manipuláveis, mas foi ali que me confrontei pela primeira vez com tentativas declaradas de manipulação”.

No Jornal de Notícias, o “ambiente era muito mais desanuviado. A redacção, de forma genérica, tinha uma atitude de independência completa e havia uma solidariedade muito grande. Lembro-me de a administração ter tentado nomear um director sem consultar o conselho de redacção e de termos levado o caso a tribunal e o processo teve de voltar ao início. Só me recordo de, uma vez, o José Saraiva , então director e depois deputado do PS, me pedir um comentário sobre um tema de actualidade política qualquer. Lá fiz o comentário, onde havia umas críticas ao Mário Soares, e ele meteu aquilo na gaveta, não publicou. Duas ou três semanas depois, quando foram publicadas as listas de candidatos a deputados do PS, entre os quais estava o José Saraiva, eu telefonei-lhe e disse-lhe: ‘É melhor publicares o artigo, porque pode ser um pouco chato que um dia destes haja um jornalista a dizer que lhe censuraste um texto…’. E ele lá publicou, no dia seguinte”.

Mas onde João Mesquita compreendeu de vez que é uma ingenuidade “pensar-se que nos jornais não há pressões, não há orientações políticas”, foi no Semanário. Este jornal, “que tinha sido porta-voz da AD no final dos anos 70 princípios dos anos 80, era então dirigido por Victor Cunha Rego , que tinha percebido que tinha de lhe ‘dar a volta’. Ele e o José Miguel Júdice , que era o presidente do conselho de administração, queriam dar-lhe um carácter mais profissional e independente. Para isso, em 1985, contrataram vários jornalistas, que não tinham nada a ver com a lógica anterior, entre os quais a Áurea Sampaio , o Eduardo Miragaia, o João Mendes e eu. Aceitei porque pagavam bastante melhor do que no JN, apesar de termos acabado de conseguir o contrato de exclusividade , e eu gostava de fazer a experiência de trabalhar num semanário, uma experiência que foi interessante mas naturalmente com limitações. Uma vez fiz um trabalho sobre o Regimento de Comandos, porque tinha morrido um militar num exercício. Na segunda-feira seguinte, de manhã, antes da reunião de redacção, estava eu no gabinete do chefe a conversar com ele quando entra o director, em vários aspectos, aliás, uma pessoa adorável. Entra e diz o seguinte (ao chefe de redacção, não a mim directamente): ‘Raul Vaz, você nunca se esqueça que foram os Comandos que fizeram o 25 de Novembro!’ . Claro que nessa semana foi já outra pessoa a tratar do assunto. A minha peça lá poria um bocado em causa os Comandos… Também me recordo que a certa altura se colocou a hipótese de eu ficar como editor da Política, hipótese que foi rapidamente abandonada com o argumento de que eu era um esquerdista”.

Pouco mais de um ano durou a sua experiência no Semanário, pois foi convidado para a editoria de Política do novo diário Público. É também no ano de 1989 que inicia o seu primeiro mandato como presidente da Direcção do Sindicato dos Jornalistas. Já fora secretário da Direcção no biénio 1985/86, ao qual se seguira o executivo presidido por Joaquim Letria, em 1987/88. “As coisas correram mal com essa direcção , como se sabe, e às tantas começou a gerar-se um movimento para se criar uma alternativa. Fizeram-se várias reuniões, discutiu-se um programa e depois pôs-se a questão da escolha dos nomes”. Goradas algumas hipóteses, por recusa, e por que “várias pessoas defendiam que devia ser eu, acabei por aceitar, com grandes resistências, porque não era uma coisa que estivesse nos meus horizontes. Nunca tinha pensado nisso e quando me vi obrigado a pensar no assunto resisti bastante, mas lá me convenceram e me convenci”.

Presidirá à Direcção do Sindicato dos Jornalistas uma segunda vez, no biénio 1991/92, embora contra o seu desejo. Lembra que “queria fazer só um mandato, porque sou um defensor acérrimo da renovação e absolutamente contra mandatos sucessivos. Todavia na Direcção acabou por se criar um consenso no sentido de fazermos outro mandato”.

O Sindicato e a tentativa da Ordem

Foi um período muito desgastante da sua vida, porque, como diz, “tivemos de gerir um sindicato mergulhado numa crise e confrontado com problemas diversos, como, por exemplo, o da Ordem, o primeiro ataque contra a Caixa de Previdência, a luta contra a proibição da circulação dos jornalistas nos corredores do Palácio de S. Bento (Assembleia da República), a reforma do Código Deontológico. Além de que tinha de trabalhar. Tinha uma vida absolutamente desgraçada, nunca mais soube o que eram folgas, férias, fins-de-semana, nada!”.

A tentativa de um grupo de profissionais de criar uma Ordem dos Jornalistas levou o Sindicato a promover, em 1992, um referendo aberto a todos os portadores de título profissional para apurar a vontade dos jornalistas sobre tal eventualidade. Os jornalistas pronunciaram-se maioritariamente contra a constituição do organismo e João Mesquita continua “a pensar que a Ordem era, e é, completamente desadequada à profissão”.

Recorda que entre os promotores da Ordem “havia pessoas com motivações e interesses muito diferentes. Havia quem achasse genuinamente que a Ordem era a melhor forma de moralizar e auto-regular a profissão. Havia quem tivesse uma certa visão elitista do jornalismo, sobretudo camaradas mais antigos e com uma carreira mais alicerçada, que temiam passar a ter de partilhar o poder nas redacções com gente mais nova. Aliás, alguns dos promotores da Ordem defendiam a criação das categorias de jornalista sénior e jornalista júnior, o que é significativo do desconforto que lhes provocava o rejuvenescimento que estava a ocorrer na profissão. E havia, ainda, os que cavalgaram essa tentativa de movimento pela criação da Ordem, numa linha claramente anti-sindical, numa linha em que a preocupação principal era atacar o Sindicato e a forma como eram apresentadas as reivindicações dos jornalistas”.

João Mesquita solicitara um mês de licença sem vencimento no Público, que lhe fora concedido, para se dedicar a tempo inteiro à campanha para o referendo sobre a Ordem dos Jornalistas. Quando voltou ao serviço foi chamado ao gabinete do director-adjunto, Jorge Wemans, que lhe comunicou que fora decidida a sua transferência da editoria de Política para a de Local. “O argumento era bastante estulto e resumia-se à necessidade de politizar o caderno de Local. Já antes houvera um problema que levou a demitir-me de fazer a cobertura das actividades do PCP, que me estava atribuída. Um dia, no início duma qualquer campanha eleitoral, fui à sede do PCP para combinar questões logísticas e fui informado por um funcionário do partido que não era eu que ia fazer a campanha, mas um outro jornalista. Voltei à redacção e escrevi uma carta a dizer que não escreveria nem mais uma linha sobre o PC, que me atribuíssem outro trabalho. Então, atribuíram-me o PS e nunca me deram qualquer justificação”.

Terá o intenso envolvimento sindical de João Mesquita desencadeado alguma má vontade? “As situações coincidem, mas não posso relacionar essas atitudes com o meu envolvimento sindical, como também não posso dizer o contrário. O que sei é que, quando solicitei a licença sem vencimento, me foram desejadas as maiores felicidades para a campanha contra a Ordem. E que quando aceitei ir para o Sindicato pus a direcção do jornal à vontade para cancelar o convite que me tinha feito. O Vicente Jorge Silva , o melhor director com quem trabalhei, disse-me que nem pensar!”.

O desgaste físico e psicológico “muito grande” a que foi sujeito durante quatro anos levam João Mesquita a começar a pensar em sair de Lisboa. Um dia, “vindo de um trabalho na FIL , eram para aí sete da tarde, demorei uma hora e meia a chegar ao Público . Estava a pagar ao motorista do táxi e digo-lhe: ‘com o tempo que demorámos tínhamos ido daqui a Coimbra’. No dia seguinte decidi-me a pedir a transferência para a delegação do jornal em Coimbra”.

A experiência da imprensa regional

Esta opção por sair de Lisboa também se deveu à desilusão provocada pelas modificações no sector ocorridas no princípio dos anos 90. João Mesquita lembra “a ressaca da privatização dos jornais públicos, com regras pouco claras e sem uma lei anticoncentração; a abertura da televisão às empresas privadas, um processo também com obscuridades; a lógica do espectáculo a sobrepor-se à informação, com a concorrência a ser levada a níveis extremos e a competitividade a contaminar os jornalistas; a presença cada vez maior de recém-licenciados nas redacções com situações de exploração escandalosas… enfim, era o princípio da situação que se vive hoje – a desregulação do mercado, dos princípios, de tudo…”.

Uma maior aproximação aos jornalistas de todo o País fora uma das preocupações do Sindicato enquanto João Mesquita presidira à Direcção. “Inclusive organizámos encontros regionais e depois um encontro nacional de jornalistas que trabalhavam fora dos grandes centros. De algum modo, isso criou-me um compromisso moral e levou-me a querer experimentar como era trabalhar fora da capital”.

Por este conjunto de razões, o exercício do jornalismo de proximidade afigurava-se como um campo de maior liberdade. Mas o futuro mostrar-lhe-á que se enganava “em larga medida”.

O pedido de transferência para a delegação do Público em Coimbra demora. “O José Manuel Fernandes, que na altura era o responsável da direcção pelas delegações, ia adiando a resposta e ao fim de três ou quatro meses, pura e simplesmente, demiti-me! A minha companheira , que também tinha pedido transferência, que lhe fora prontamente concedida, não podia esperar mais e aí fomos para Coimbra, comigo desempregado”.

Instalado na terra natal, passadas umas semanas é convidado para o Diário As Beiras, um semanário que ia passar a diário. “Lá fui, nessa fase de lançamento elaborei umas regras estilísticas, o estatuto editorial, participei na formação de jornalistas e, quando chegou a altura, comecei a escrever. Mas ao quarto número censuraram-me um texto. Era um artigo sobre o Baptista-Bastos , que tinha ido a Coimbra fazer uma conferência sobre jornalismo e literatura. Eu propusera que em vez da rotineira cobertura da conferência fizéssemos uma reportagem sobre o tema e o protagonista. Andei todo o dia com ele, acabámos a conversa lá para as quatro ou cinco da manhã. Fui directo para a redacção escrever a peça e ao fim da manhã estava feita e entregue. A certa altura fui chamado à chefia da redacção, porque discordavam da legenda duma foto em que utilizara uma afirmação do Bastos. Ele criticava, com o tom desassombrado de sempre, o Guterres, o Cunhal, o Manuel Monteiro e o Cavaco, de quem dizia que era ‘um parolo que sabe falar inglês, língua que, como toda a gente sabe, se aprende em duas horas’. Depois de alguma discussão acedi a retirar a legenda, pois fora do contexto podia parecer uma coisa acintosa contra o Cavaco. Mais tarde, alguém me avisou que a expressão também fora retirada do texto. Ou seja, ficavam as críticas do Baptista-Bastos a todos os outros menos ao Cavaco. Fui dizer ao chefe de redacção, que era o Rui Avelar , que se voltasse a fazer uma coisa daquele género denunciaria a situação publicamente porque se tratava de um acto de censura. Ele levou a mal e chamou o delegado da administração, Lino Vinhal, que achou que eu tinha faltado ao respeito ao chefe e suspendeu-me. Tentaram abrir-me um processo disciplinar, mas como não arranjaram nenhum jornalista que depusesse contra mim tiveram de arquivar o processo e ao fim de quatro dias os administradores chamaram-me para voltar a trabalhar. Eu disse-lhes que se quisessem começava imediatamente, mas que não podia nem ver o senhor que me tinha suspendido naquelas condições. Portanto, que arranjassem uma forma de eu trabalhar num sítio onde não o visse. Explicaram-me que não podiam fazer isso e eu expliquei-lhes que, assim sendo, não podia começar a trabalhar. E mais uma vez me despedi, sem indemnização, sem nada”.

Se a experiência de João Mesquita na imprensa regional lhe reforçou a ideia de que poderia ser um espaço atraente para muitos jornalistas, também lhe demonstrou que os empresários da imprensa regional “são como os outros com a agravante de, duma forma geral, serem bastante mais submissos e dependentes dos poderes. É muito difícil desenvolver projectos sólidos e com independência nas regiões”.

Fica três ou quatro meses no desemprego, depois de abandonar o Diário As Beiras. Repentinamente, numa semana surgem-lhe três possibilidades de emprego: SIC, Diário de Notícias (DN) e O Independente. A SIC obrigava-o a vir para Lisboa; a proposta do DN, embora permanecesse em Coimbra, “era péssima do ponto de vista salarial: metade do que pagavam no Diário As Beiras”.

Optou por O Independente, que lhe permitia ficar em Coimbra com um salário semelhante ao anterior. João Mesquita achava que o semanário “estava a ter uma evolução positiva e que, apesar de manter uma posição editorial conservadora, estrategicamente servia muita gente e do ponto de vista do jornalismo permitia uma liberdade de funcionamento muito grande e uma lógica de independência na escrita”. O que, garante, “confirmei depois, porque durante a direcção de Paulo Portas nunca tive um texto censurado ou coisa do género; e nalguns problemas que tive com os poderes locais em Coimbra tive sempre uma cobertura absoluta do jornal. Por isso, apesar da regressão que se seguiu à saída de Portas, mantive-me em O Independente até às manifestações óbvias de crise no jornal, que se tornaram mais evidentes, justamente, a partir do fecho das delegações”.

Fica desempregado outra vez, em Outubro de 2000. Entretanto, nascera a sua filha, Joana. Opta por permanecer em Coimbra e tenta sobreviver como freelance. Escreve para várias publicações, mas desilude-se. “Os jornais pagam pessimamente, perde-se mais tempo a discutir quando e como é que pagam do que a fazer o trabalho, combina-se um artigo e sai três meses depois… A prática demonstrou-me que, ao contrário do que pensava, não me governava como freelance. Pela primeira vez na minha vida, passei por uma situação muito difícil do ponto de vista económico”.

Por isso, quando tem um convite para a redacção de A Capital – onde já colaborava com uma crónica semanal – não hesita e regressa a Lisboa, em Fevereiro de 2002. No vespertino reencontra o gosto de trabalhar numa redacção, “ainda para mais desejosa de evoluir, alegre, sem preconceitos. A delegação de O Independente em Coimbra era eu mais eu e sentia a falta da crítica, da discussão, do convívio…”.

Mas A Capital sofria de problemas estruturais : “Uma redacção muito jovem e, de um modo geral, mal paga; uma administração que não sabia para que é que queria o jornal; um director, o António Matos , que, como muitos dos directores de hoje, era mais administrador do que director, mais preocupado com problemas de gestão do que com as questões editoriais. Eu era amigo do António Matos, até tínhamos relações familiares, e portanto sentia-me à vontade para lhe dizer repetidamente que havia questões que tinham de ser solucionadas. Dizia-lhe eu e diziam-lhe outros, como o Torcato Sepúlveda , que também era amigo dele, do tempo do Público”.

A confiança era tal que “a dada altura o Matos colocou a possibilidade de eu ser director do jornal, ficando ele só como administrador. Eu aceitei, desde que fossem reunidas algumas condições. Nunca chegaram a sê-lo, mas também não foi preciso porque a administração espanhola, entretanto, vetou o meu nome, por me considerar esquerdista. Depois, o Matos insistiu comigo para ser editor da Política, o que recusei em coerência com a apreciação que a administração fizera. Acabei por aceitar partilhar a responsabilidade da editoria de Lisboa. E um mês depois fui despedido! Eu e o Torcato. O pretexto formal do António Matos foi que não me podia pagar o salário que negociara comigo. Depois de me despedir, a mim, que ganhava 1500 euros, foi buscar um director editorial mais um director-adjunto e um director de arte, os quais, seguramente, recebiam mais do que eu e o Torcato. Contratou também vários cronistas e alguns redactores. O resultado, infelizmente, foi o que se sabe… ”.

Desemprego de longa duração

Outubro de 2003. João Mesquita fica desempregado mais uma vez. Três anos e meio depois, à data desta entrevista, em Janeiro de 2007, mantém-se desempregado. Já se esgotou o período do subsídio de desemprego e está a viver do subsídio social, 300 e poucos euros por mês, e de uma ou outra colaboração, “cada vez menos e pior pagas”.

Por que não tem este jornalista lugar numa redacção? Dir-se-á que a experiência, a memória histórica, o conhecimento de fontes deixaram de ser factores de valorização profissional. Aliás, é público e está amplamente documentado que, sobretudo, desde os primeiros anos deste século as empresas vêm executando um programa de afastamento das redacções dos jornalistas com idade superior a 50 anos. Actualmente, essa tendência já atinge alguns profissionais com menos de 50 anos e, num ou noutro caso, até com menos de 40 – desde que não seja suficientemente moldável e submisso, segundo os padrões da hierarquia. Dir-se-á, então, que jornalistas com espírito crítico não são bem vistos nas redacções do jornalismo actual.

Dir-se-á, também, que o acesso à profissão, apesar das avalanches de propostas de jovens recém-licenciados que desabam nas redacções, continua a ser feito maioritariamente através de redes de conhecimentos e amizades. Mas conhecimentos são coisa que não falta a João Mesquita: 27 anos de profissão, antigo presidente do SJ, experiência adquirida em várias redacções. Alguns jornalistas da sua geração, como diversos antigos camaradas de A Voz do Povo, ocupam mesmo cargos de direcção em jornais de renome, um dos quais, o Expresso, procedeu recentemente a uma reestruturação da redacção na sequência da saída de alguns dos seus membros para o concorrente Sol.

Reconhece que sempre foi, em todas as redacções, uma pessoa muito crítica. “Nunca deixei de exprimir as minhas opiniões sobre o jornalismo e sobre as condições do exercício da profissão, mas julgo ser uma pessoa com um razoável feitio, nunca tive conflitos pessoais com camaradas. O que todos sabem é que não sou subserviente, que não sou seguidista, que continuo a ter um juízo bastante negativo sobre a evolução do jornalismo. O que está a acontecer comigo já aconteceu e acontece com muitos outros. Ainda há poucos meses, o Público despediu uma série de jornalistas , entre os quais alguns que eu considero serem ‘apenas’ dos melhores profissionais da nossa imprensa diária. Portanto…”.

João Mesquita encara o seu futuro no jornalismo sem optimismo. “A tendência dominante vai contra aquilo que eu penso que devia ser feito, a degradação das condições de trabalho e de vida dos jornalistas é cada vez maior. Vive-se uma situação de desregulação total no sector, inclusive de ausência de princípios éticos. E nos jornais domina a ideia de que eles não são para ler, mas para ver. A principal razão da crise dos jornais é essa: quando se fazem jornais para não serem lidos, pois não serão lidos! É muito mais interessante e fácil para o cidadão comum olhar para uma televisão ou para um ecrã de computador, ou mesmo só ouvir rádio, do que estar a ver jornais”.

Embora resista muito, João Mesquita encara a possibilidade de mudar de profissão. “Não tenho estado disponível para trocar esta profissão por outra, designadamente por assessorias de imprensa. Tive alguns convites, mas até hoje só admiti aceitar um. Fui informado de que fora escolhida outra pessoa e, no fundo, senti um certo alívio. Creio que só conseguiria ser assessor duma pessoa com quem estivesse de acordo no fundamental e com quem me desse muito bem. Em quem tivesse confiança política e pessoal – o que é muito difícil… Quando decidir abandonar, certamente será por uma actividade mais afastada do jornalismo”.

Uma situação prolongada de desemprego gera inevitavelmente alterações na vida pessoal e familiar. A viver com uma jornalista, João Mesquita considera que se isso tem desvantagens, também tem, seguramente, vantagens: “As pessoas podem compreender melhor uma parte importante da vida do parceiro, designadamente se partilharem das mesmas interrogações e angústias, o que se pode traduzir num apoio maior”.

Alterações inevitáveis são também ao nível dos consumos, em geral, a que não escapam os instrumentos de cultura. “Viciado em livros”, como se classifica, João Mesquita teve de abdicar de outros hábitos – música, teatro, cinema – para “privilegiar os livros, e, mesmo aqui, pensando três vezes antes de comprar.”

O que não alterou foram as convicções políticas. "Mantenho-me no mesmo campo político. Pessoalmente fiz muita asneira, reconheço, mas não passei a pensar o contrário. Mantenho uma ideia essencial: a defesa de uma transformação radical, profunda, da sociedade. Continuo a acreditar nisso. Não defendo o modelo chinês ou o modelo albanês, como defendi, mesmo conhecendo-os mal. Mas não foram os modelos que me levaram a optar por esse campo político da esquerda. O que me determinou foi o desejo duma transformação substantiva da sociedade e esse ideal mantenho-o, porque os problemas não estão resolvidos. Em Portugal, o 25 de Abril resolveu algumas coisas, nomeadamente no domínio dos costumes e das liberdades políticas, mas não produziu essa transformação radical do sistema. Um sistema marcado por gritantes desigualdades sociais, com que não me consigo conformar”.

A crença religiosa, essa sim, abandonou-a João Mesquita. O menino de educação católica, apostólica e romana, que ajudou à missa e quase foi activista da JEC, iniciou-se na perda da fé por motivos dados pelos seus guardiões. “O padre Agostinho, que dava aulas de Religião e Moral no liceu de Castelo Branco e que punha dezenas de miúdos a participar em actividades ligadas à Igreja, a certa altura foi retirado para Portalegre, pelo Bispo que o colocou junto de si com funções burocráticas. Isto foi entendido como um saneamento e provocou em muita gente uma grande revolta. Para mim, foi o início dum processo de afastamento. Comecei a interrogar-me sobre a doutrina e as práticas da hierarquia da Igreja e a afastar-me delas. Com o tempo, tornei-me ateu: deixei de acreditar, pura e simplesmente, na existência de um Deus”.

Também não alterou a sua adesão ao sindicalismo . Ainda hoje considera que os quatro anos como presidente da Direcção do Sindicato dos Jornalistas foram “uma experiência extraordinária e altamente gratificante” para si. “Possibilitaram-me um conhecimento muito mais aprofundado do jornalismo, dos jornalistas e das redacções. Ensinaram-me muitas coisas sobre a natureza humana, a classe política e empresarial. E permitiram-me trabalhar com pessoas fantásticas, a começar pelo próprio SJ”.

Uma experiência que não acarretou nenhuma desilusão relativamente aos jornalistas, na sua globalidade, nem relativamente ao jornalismo em si. “A profissão e o jornalismo estão a passar por uma crise muito profunda e muito prolongada, que provavelmente ainda se vai agudizar, mas isso não me leva a pensar que os jornais perderam o sentido ou que os jornalistas não são precisos para nada e que qualquer escriba faz o que nós fazemos”.

Sobre o uso da tecnologia digital e os seus efeitos, João Mesquita alerta para a imprescindível cautela em não ser “utilizada contra os princípios do jornalismo e dos jornalistas”. Não tem aversão à tecnologia e lembra que no dia em que chegou à redacção do Público só se viam computadores. “Não havia sequer uma única máquina de escrever... Fiquei assustadíssimo… mas ao fim de dois dias já estava relativamente à vontade, embora ainda hoje esteja longe de explorar todas as potencialidades que o computador tem”. Entende que “a vocação e a especialização relativamente aos diferentes meios tem de ser preservada. É inconcebível que a um jornalista se exija o domínio de todos os meios técnicos. Isso seria um recuo muito grande para a profissão, embora alguns jornalistas possam pensar que é um avanço”.

João Mesquita não tem dúvida: “Verifica-se, hoje, uma nova escalada contra o jornalismo – pelo menos como eu o entendo –, que exige de nós, jornalistas, uma reflexão, sobretudo nas redacções, onde não há a discussão que havia e é necessário que haja. As redacções pensam pouco, agem ainda menos, e as direcções e as administrações, que julgam poder falar por nós, só pensam no lucro imediato, nem no lucro futuro pensam”.

A concluir, João Mesquita lembra que "um ministro dum Governo AD disse, em certa ocasião, que fazer jornais era como fazer salsichas. Na altura, houve uma grande onda de rejeição às palavras do homem. Mas muitos dos que então se insurgiram, hoje, infelizmente, contribuem activamente para que essa ideia triunfe".


DADOS SOCIOGRÁFICOS

Nome: João Mesquita (João Bernardo Bigotte da Costa de Mesquita)
Data nascimento: 03/06/1957
Natural de Coimbra
Sexo Masculino
Habilitações académicas: Ensino Secundário (Liceu Passos Manuel, 1978)
Situação profissional actual: Desempregado (Outubro 2003)
Carreira profissional: Notícias da Tarde (01/04/1982); Jornal de Notícias (01/02/1985 – 15/04/1088); Semanário (01/051988 – xx/09/1989); Público (01/10/1989 – xx/08/1993); Diário As Beiras (05/09/1993 – xx/03/1994); Desemprego (Abril a Set 1994); O Independente (01/10/1994 – xx/10/2000); A Capital (01/03/2002 – xx/10/2003)
Data em que se iniciou na profissão: Março 1979 (Voz do Povo)
Estatuto profissional: Carteira Profissional Nº 743; Secretário da Direcção do SJ 1984-198; Presidente da Direcção do SJ 1989-1990, Idem 1991-1992; Presidente do Conselho Geral do SJ 1995-1996; Coordenador do Núcleo de Coimbra do SJ; Conselho de Redacção do JN, Idem de O Independente
Profissão dos pais: Pai Juiz de Direito; Mãe Doméstica
Data da entrevista: Janeiro 2007
Entrevistador: José Luiz Fernandes


(*) Entrevista realizada em Janeiro de 2007 por José Luiz Fernandes, no âmbito do projecto de investigação "Perfil Sociológico do Jornalista Português", financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e coordenado por José Rebelo.





COMUNICADO DO SINDICATO DOS JORNALISTAS

2009/MAR/12

Justa homenagem a João Mesquita

"Profissional exemplar, cidadão consequente com as suas convicções e sindicalista coerente com os seus princípios morais e profundamente dedicado às causas da classe" - assim se refere o Sindicato dos Jornalistas (SJ) ao camarada João Mesquita, na sentida nota divulgada a 12 de Março assinalando o seu desaparecimento.
O documento lembra que o camarada de profissão agora desaparecido dedicou a sua vida às causas em que acreditava e à defesa do jornalismo e dos jornalistas, sublinhando ser justo destacar "como homenagem a quem prestou tão relevantes serviços ao Sindicato e à classe que este serve, que João Mesquita não perdeu esse derradeiro combate, pois a gratificante memória que nos deixa do que foi – como cidadão, como profissional e como sindicalista – mostra que é possível continuar a lutar por um futuro mais justo e mais fraterno".

É o seguinte o texto, na íntegra, da Nota da Direcção do Sindicato dos Jornalistas:

O último combate do João Mesquita

A Direcção do Sindicato dos Jornalistas recebeu com grande consternação a notícia da morte do jornalista João Mesquita, antigo presidente da Direcção e do Conselho Geral do SJ, profissional exemplar, cidadão consequente com as suas convicções e sindicalista coerente com os seus princípios morais e profundamente dedicado às causas da classe.

Dotado de uma generosidade abnegada e de uma infinita solidariedade, João Mesquita percorreu um exaltante caminho de vida orientado pelo sentido da fraternidade, de cuidada atenção aos problemas dos que o cercavam, de resistência às injustiças e às ofensas aos direitos das pessoas, de fecunda intervenção cívica e política, de participação desinteressada nos combates a que generosamente se entregou ao longo da vida.

Nascido em Coimbra em 3 de Junho de 1957, João Mesquita foi um empenhado activista nas causas em que acreditou desde a sua juventude, tendo iniciado a profissão em Março de 1979 no jornal “Voz do Povo”. Trabalhou, depois, no vespertino “Notícias da Tarde” (1982), onde se destacou como repórter parlamentar, transitando para o “Jornal de Notícias” (1985) e, posteriormente (1988), para o “Semanário”, de onde saiu para integrar a Redacção fundadora do “Público (1989), tendo permanecido neste jornal até 1993. Trabalhou, depois, no diário “As Beiras” (até 1994), no semanário “Independente” e em “A Capital”, de onde saiu em Março de 2002. Como freelance, manteve colaborações com várias publicações, nomeadamente o semanário “Expresso”.

Durante os últimos anos, João Mesquita combateu com intensa coragem e lucidez profunda um cancro pulmonar que teimava em tolher os passos que desejava dar no seu percurso de homem bom e solidário. Podemos dizer com orgulho que esteve com as causas dos jornalistas até ao limite das suas forças, mesmo quando estas minguavam. Há uma semana, foi um dos 119 primeiros subscritores do manifesto público contra o despedimento colectivo/selectivo na Controlinveste.

Eleito para a Direcção do SJ, primeiro como secretário (1984), depois como presidente (1989), cargo que ocupou até 1993, João Mesquita, que também foi presidente do seu Conselho Geral (1993 e 1998), deu ao Sindicato e à classe um conjunto de contributos de vital importância para a nossa organização e para os jornalistas em geral, mesmo quando já não exercia funções nos seus órgãos. São de destacar:

A enorme acuidade na observação de novos fenómenos, como o crescimento da imprensa regional e o aparecimento das rádios locais, bem como a pertinência na resposta aos problemas a eles ligados, designadamente a formação dos seus profissionais e a necessidade de descentralizar a acção sindical, tendo promovido e dinamizado uma série de encontros regionais;

A preocupação com a formação dos jornalistas, designadamente ao nível da formação universitária especificamente em Jornalismo, tendo sido um activista essencial da criação do Curso de Jornalismo da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra – o primeiro com esta designação;

O denodado combate ao projecto de criação de uma Ordem de jornalistas, defendendo, durante uma longa campanha e com sacrifício pessoal, as ideias basilares da liberdade de associação e da rejeição da ingerência do poder político na forma de organização e de governo da classe, e logrando alcançar o sufrágio maioritário dos jornalistas nas posições do SJ que tão empenhadamente defendeu;

O seu empenhamento no conjunto de debates e reflexões sobre a última revisão do Estatuto do Jornalista promovido pela Direcção do SJ, no qual participou sempre com a vivacidade das suas ideias e convicções e disponibilidade para ouvir as dos outros;

A sua companhia solidária e as suas intervenções nas reuniões e encontros realizados pelo Sindicato para organizar a resistência contra a extinção da Caixa dos Jornalistas;

A sua participação activa no Encontro de Jornalistas Freelance e Precários e a colaboração decisiva que emprestou às tarefas que se lhe seguiram, designadamente as missões do Grupo de Trabalho para esta área entretanto criado.

No dia da morte que infelizmente se anunciava, é justo assinalar, como homenagem a quem prestou tão relevantes serviços ao Sindicato e à classe que este serve, que João Mesquita não perdeu esse derradeiro combate, pois a gratificante memória que nos deixa do que foi – como cidadão, como profissional e como sindicalista – mostra que é possível continuar a lutar por um futuro mais justo e mais fraterno. É também justo envolver nesta homenagem a sua mulher, a nossa camarada Clara Vasconcelos, igualmente credora da nossa admiração.

Lisboa, 12 de Março de 2009

A Direcção

http://apaginadomario.blogspot.com/

quarta-feira, março 11, 2009

chantagem


Para que não se esqueçam!!!

terça-feira, março 10, 2009

Professor Medina Carreira
(sem papas na língua...)

Reflexões: Professor Medina Carreira

Nota: O Professor Medina Carreira, um dos mais capacitados economistas portugueses, sempre que fala, deixa o País a reflectir, estupefacto.
Aqui deixamos a síntese de uma das últimas entrevistas que concedeu e a não perder.

"Vocês, comunicação social, o que dão é esta conversa de «inflação menos 1 ponto», o «crescimento 0,1 em vez de 0,6»....Se as pessoas soubessem o que é 0,1 de crescimento, que é um café por português de 3 em 3 dias...
Portanto andamos a discutir um café de 3 em 3 dias...mas é sem açucar..."

"Eu não sou candidato a nada, e por conseguinte não quero ser popular.
Eu não quero é enganar os portugueses. Nem digo mal por prazer, nem quero ser «popularuxo» porque não dependo do aparelho político!"

"Ainda ?há dias eu estava num supermercado, numa bicha para pagar, e estava uma rapariga de umbigo de fora com umas garrafas, e em vez de multiplicar «6x3=18», contava com os dedos: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7... Isto não é ensino...é falta de ensino, é uma treta! É o futuro que está em causa!"

"Os números são fatais. Dos números ninguém se livra, mesmo que não goste. Uma economia que em cada 3 anos dos últimos 27, cresceu 1% em 2...esta economia não resiste num país europeu."

"Quem anda a viver da política para tratar da sua vida, não se pode esperar coisa nenhuma. A causa pública exige entrega e desinteresse."

"Se nós já estamos ultra-endividados, faz algum sentido ir gastar este dinheiro todo em coisas que não são estritamente indispensáveis?
P'ra gente ir para o Porto ou para Badajoz mais depressa 20 minutos?
Acha que sim?
A aviação está a sofrer uma reconversão, vamos agora fazer um aeroporto, secalhar não era melhor aproveitar a Portela?
Quer dizer, isto está tudo louco?"

"Eu por mim estou convencido que não se faz nada para pôr a Justiça a funcionar porque a classe política tem medo de ser apanhada na rede da Justiça. É uma desconfiança que eu tenho. E então, quanto mais complicado aquilo fôr..."

"Nós tivemos nos últimos 10-12 anos 4 Primeiros-Ministros:
-Um desapareceu;
-O outro arranjou um melhor emprego em Bruxelas, foi-se embora;
-O outro foi mandado embora pelo Presidente da República;
-E este coitado, anda a ver se consegue chegar ao fim e fazer alguma coisa..."

"O João Cravinho tentou resolver o problema da corrupção em Portugal.
Tentou. Foi "exilado" para Londres. O Carrilho também falava um bocado, foi para Paris. O Alegre depois não sei para onde ele irá...
Em Portugal quem fala contra a corrupção ou é mandado para um "exílio dourado", ou então é entupido e cercado."

"Mas você acredita nesse «considerado bem»?
Então, o meu amigo encomenda aí uma ponte que é orçamentada para 100 e depois custa 400? Não há uma obra que não custe 3 ou 4 vezes mais? Não acha que isto é um saque dos dinheiros públicos? E não vejo intervenção da polícia...
Há-de acreditar que há muita gente que fica com a grande parte da diferença!"

"De acordo com as circunstâncias previstas, nós por volta de 2020 somos o país mais pobre da União Europeia. É claro que vamos ter o nome de Lisboa na estratégia, e vamos ter ,eventualmente, o nome de Lisboa no tratado.
É, mas não passa disso. É só para entreter a gente..."

"Isto é um circo. É uma palhaçada. Nas eleiçoes, uns não sabem o que estão a prometer, e outros são declaradamente uns mentirosos:
-Prometem aquilo que sabem que não podem."

"A educação em Portugal é um crime de «lesa-juventude»:
Com a fantasia do ensino dito «inclusivo», têm lá uma data de gente que não quer estudar, que não faz nada, não fará nada, nem deixa ninguém estudar. Para que é que serve estar lá gente que não quer estudar?
Claro que o pessoal que não quer estudar está lá a atrapalhar a vida aqueles que querem estudar. Mas é inclusiva.... O que é inclusiva? É para formar tontos? Analfabetos?"

"Os exames são uma vergonha. Você acredita que num ano a média de Matemática é 10, e no outro ano é 14? Acha que o pessoal melhorou desta maneira? Por conseguinte a única coisa que posso dizer é que é mentira!
Está-se a levar a juventude para um beco sem saída. Esta juventude vai ser completamente desgraçada! "

"A minha opinião desde hà muito tempo é TGV- Não!
Para um país com este tamanho é uma tontice.
O aeroporto depende. Eu acho que é de pensar duas vezes esse problema.
Ainda mais agora com o problema do petróleo.
"Bragança não pode ficar fora da rede de auto-estradas? Não?
Quer dizer, Bragança fica dentro da rede de auto-estradas e nós ficamos encalacrados no estrangeiro? Eu nem comento essa afirmação que é para não ir mais longe...
Bragança com uma boa estrada fica muito bem ligada.
Quem tem interesse que se façam estas obras é o Governo Português, são os partidos do poder, são os bancos, são os construtores, são os vendedores de maquinaria...Esses é que têm interesse, não é o Português!"

"Nós em Portugal sabemos resolver o problema dos outros:
A guerra do Iraque, do Afeganistão, se o Presidente havia de ter sido o Bush, mas não sabemos resolver os nossos. As nossas grandes personalidades em Portugal falam de tudo no estrangeiro: criticam, promovem, conferenciam, discutem, mas se lhes perguntar o que é que se devia fazer em Portugal nenhum sabe. Somos um país de papagaios...

Receber os prisioneiros de Guantanamo?
«Isso fica bem e a alimentação não deve ser cara...»
Saibamos olhar para os nossos problemas e resolvê-los e deixemos lá os outros...
Isso é um sintoma de inferioridade que a gente tem, estar sempre a olhar para os outros. Olhemos para nós!"

"A crise internacional é realmente um problema grave, para 1-2 anos.
Quando passar lá fora, a crise passará cá.
Mas quando essa crise passar cá, nós ficamos outra vez com os nossos problemas, com a nossa crise.
Portanto é importante não embebedar o pessoal com a ideia de que isto é a maldita crise. Não é!"

"Nós estamos com um endividamento diário nos últimos 3 anos correspondente a 48 milhões de euros por dia:
Por hora são 2 milhões! Portanto, quando acabarmos este programa Portugal deve mais 2 milhões! Quem é que vai pagar?"

"Isso era o que deveríamos ter em grande quantidade. Era vender sapatos. Mas nós não estamos a falar de vender sapatos. Nós estamos a falar de pedir dinheiro emprestado lá fora, pô-lo a circular, o pessoal come e bebe, e depois ele sai logo a seguir..."

"Ouça, eu não ligo importância a esses documentos aprovados na Assembleia...Não me fale da Assembleia, isso é uma provocação...
Poupe-me a esse espectáculo...."

"Isto da avaliação dos professores não é começar por lado nenhum. Eu já disse à Ministra uma vez «A senhora tem uma agenda errada"» Porque sem pôr disciplina na escola, não lhe interessa os professores. Quer grandes professores? Eu também, agora, para quê?
Chegam lá os meninos fazem o que lhes dá na cabeça, insultam, batem, partem a carteira e não acontece coisa nenhuma. Vale a pena ter lá o grande professor? Ele não está para aturar aquilo...
Portanto tem que haver uma agenda para a Educação. Eu sou contra a autonomia das escolas. Isso é descentralizar a «bandalheira»."

"Há dias circulava na Internet uma noticía sobre um atleta olímpico que andou numa "nova oportunidade" uns meses, fez o 12ºano e agora vai seguir Medicina... Quer dizer, o homem andava aí distraído, disseram «meta-se nas novas oportunidades» e agora entra em Medicina...
Bem, quando ele acabar o curso já eu não devo cá andar felizmente, mas quem vai apanhar esse atleta olímpico com este tipo de preparação...
Quer dizer, isto é tudo uma trafulhice..."

"É preciso que alguém diga aos portugueses o caminho que este país está a levar.
Um país que empobrece, que se torna cada vez mais desigual, em que as desigualdades não têm fundamento, a maior parte delas são desigualdades ilegítimas para não dizer mais, numa sociedade onde uns empobrecem sem justificação e outros se tornam multi-milionários sem justificação, é um caldo de cultura que pode acabar muito mal. Eu receio mesmo que acabe."

"Até hà cerca de um ano eu pensava que íamos ficar irremediavelmente mais pobres, mas aqui quentinhos, pacifícos, amiguinhos, a passar a mão uns pelos outros...
Começo a pensar que vamos empobrecer, mas com barulho...
Hoje, acrescento-lhe só o «muito».
Digo-lhe que a gente vai empobrecer, provavelmente com muito barulho...
Eu achava que não havia «barulho», depois achava que ia haver «barulho», e agora acho que vai haver «muito barulho».
Os portugueses que interpretem o que quiserem..."

"Quando sobe a linha de desenvolvimento da União Europeia sobe a linha de Portugal. Por conseguinte quando os Governos dizem que estão a fazer coisas e que a economia está a responder, é mentira!
Portanto, nós na conjuntura de médio prazo e curto prazo não fazemos coisa nenhuma. Os governos não fazem nada que seja útil ou que seja excessivamente útil. É só conversa e portanto, não acreditem...
No longo prazo, também não fizemos nada para o resolver e esta é que é a angústia da economia portuguesa."

"Tudo se resume a sacar dinheiro de qualquer sitío. Esta
interpenetração do político com o económico, das empresas que vão buscar os políticos, dos políticos que vão buscar as empresas...
Isto não é um problema de regras, é um problema das pessoas em si...
Porque é que se vai buscar políticos para as empresas?
É o sistema, é a (des)educação que a gente tem para a vida política...
Um político é um político. E um empresário é um empresário. E não deve haver confusões entre uma coisa e outra. Cada um no seu sítio.
Esta coisa de ser político, depois ministro, depois sai, vai para ali, tira-se de acolá, volta-se para ministro...é tudo uma sujeira que não dá saúde nenhuma à sociedade."

"Este país não vai de habilidades nem de espectáculos. Este país vai de seriedade. Enquanto tivermos ministros a verificar preços e a distribuir computadores, eles não são ministros! Eles não são pagos nem escolhidos para isso! Eles têm outras competências e têm que perceber quais os grandes problemas do país!"

"Se aparece aqui uma pessoa para falar verdade, os vossos comentadores dizem «este tipo é chato, é pessimista»....
Se vem aqui outro trafulha a dizer umas aldrabices fica tudo satisfeito...
Vocês têm que arranjar um programa onde as pessoas venham à vontade, sem estarem a ser pressionadas, sossegadamente dizer aquilo que pensam. E os portugueses se quiserem ouvir, ouvem. E eles vão ouvir,
porque no dia em que começarem a ouvir gente séria e que não diz aldrabices, param para ouvir. O Português está farto de ser enganado!
Todos os dias tem a sensação que é enganado!"